Tinha largado a namorada. Fazia tempo que não saia pela noite,
para ver gente, mulheres. Era hora de esquecer um pouco o tal do “clube
dos solitários” (no qual existem milhares de sócios em todo
o Brasil) e resgatar o velho tigrão, o terror das secretárias
bilíngües. Era a volta de um velho sucesso, só que agora
remixado, ou seja, um cara de 30 anos, com rosto de 27, corpo de 25 e mãos
taradas de 15. Procurando, é claro.
Liguei para um amigo.
— Passo aí umas 11:30.
* Tô te esperando, então.
Vamos ver o que coloco. Bom, o frio é uma época em que
as pessoas se vestem bem. Tem todo um charme, um glamour. Olhei para uma
camisa azul marinho, que era meu antigo jaleco de guerra. Ela fez que não
era com ela. É verdade, desta vez a coisa estava com cara de paz
e muito amor. É simplesmente “a” volta. Só que estava faltando
ali no meu guarda roupa um casaco de couro ou uma jaqueta bem transada.
Fui bater um guarda roupa de minhas irmãs. Talvez tire um coelho
de uma cartola. Entre saias, coletes e vontade de desencalhar, achei o
que parecia ser um casaco. Pelas medidas ficava grande para elas...mas
pequeno para mim. Não dá nada não. Era deixar o casaco
aberto e não esticar os braços (que as mangas vinham nos
cotovelos). Coloquei uma camiseta básica preta para não inventar
e CABRUM, estava eu preparado, um bad boy. Passei um gel no cabelo. Levo
camisinha ou não? Puta que o pariu, mauricinho, vá se foder,
vai.
Emprestei dinheiro de minha irmã. Passei no posto e botei cincolão
de álcool. Segui para a casa de meu amigo. Camarada mesmo (me ensinou
a técnica de desviar de pessoas que estão vindo em sua direção
na rua). Gente boa. Trabalhava comigo. Estava também sem namorada.
O cara entrou no meu monzão com um copo de whisky regado.
* E aí fera, beleza?
— Pô maravilha. (entra logo, mas cuidando com este copo)
* É isso aí psiti, hoje a coisa vai rolar. Uhuhuhuhu...
E bateu a porta do carro com tanta força que o painel sacolejou.
Fui falar alguma coisa, mas deixei barato.
(Aquela história de perguntar se o cara não tem geladeira
em casa já não dá mais tesão nenhum)
— Vamos fazer o seguinte: não vamos falar de emprego, nem de
namoradas, nem de dinheiro...eu sou teu amigo, conheço tua vida
e vamos putiar por aí. Belê?
* Tá fechado. Dá pra ligar o rádio?
— Vai aí.
Não funcionou. (o que que essa mão seca fez no meu rádio?)
Fui.
Na primeira curva o desgraçado derrubou whisky no estofado.
E eu é que tive que pedir desculpas. Pedi para ele me dar um pouco
do “veneno”. Tomei metade do copo e mastiguei um gelo. Tava resolvido,
em parte, o problema.
Então fomos para a velha estratégia: rodamos e rodamos os bares por aí. O lugar que tivesse a maior fila e aquele que sentirmos o “felling” de presença de mulheres nós entramos.Paramos numa casa de Axé. A fila tava duas cuecas para cada calcinha rendada, bonitinha, uma gracinha. É, o desespero faz a gente ver coisas.
Meia hora de fila. Meia hora de frio. Meus poucos pêlos do peito estavam em passeata exigindo os mesmos direitos dos pêlos do saco. Acordo negado.
Atrás de nós havia um grupo de três meninas.
Vamos lá garotão, comece a treinar:
— Vocês tem bônus? (com cara de milhares de más
intenções)
* Não (nojo).
— Vocês estão sozinhas? (com cara de algumas más
intenções)
Uma olhou para outra e nem responderam.
(Última pergunta: Vocês chupam?)
Era só para esquentar.
Finalmente chegamos na entrada.
* R$ 5,00 de couvert e R$ 10,00 de consumação.(uma cutelada
nas costas de um desempregado). Estava com R$ 20,00, um halls e três
convites para a “Noite dos Fudidos”. Eram estas “as armas de Jorge”.
Depois da revista de praxe entram os dois coiotes no recinto pela porta
da saída. A banda agita a galera. A mulherada tava lá esparramada
pelo salão. E levanta a mão, põe a mão na cinturinha,
dá uma rodadinha, abaixa, ordinária, abaixa. E elas abaixavam.
Me senti mais deslocado que cebola em salada de frutas.
Ei, uma moreninha baixinha batatinha olhou para mim. A noite estava
reconhecendo seu filho amado.
* Vamos para o bar.
— Só.
Atravessamos a pista de dança e chegamos no balcão. De
lá começamos a escolher. Dois voyeurs.
— Vamos trabalhar em dupla, se é que você me entende.
* Não, claro. É arrastar duas e pau na mandioca.
Qualquer coisa estou sozinho em casa
Fomos para o mezanino, para ter a visão completa do terreno.
De repente uma moça (estou sendo gentil, uma senhora) aparece do
nada do meu lado.
* Olha é pra você.
E me entregou um pequeno bilhete.
“Obrigado por você existir” Jussara.
Segui para ver onde ela ia parar.
Ela sentou na mesa do Steven Spielberg. Ele estava ali rodando “A lista
secreta de Jurassic Park” (Coming soon).
Descartei com fineza a velha dama de copas. Eu era um ás (de
casaco) de paus, cacete. E além do mais a noite era apenas uma criança,
carente, mas uma criança.
Segue a noite.
— Gostosa a morena ali, hein.
* Duvida que eu chego nela?
— Vai lá. (Já tinha visto um Pterossauro, mesmo. Vou
duvidar mais do quê?)
Tava na cara que o meu já manguaçado camarada ia se dar mal. Moça em rodinha, com amigas e amigos, dançando. Hum, danada não. Vou buscar mais uma cerveja ou quem sabe uma caipirinha de vodka pra mudar a voltagem de 110 para 220.
Voltei para a cena do crime, procurando meu amigo que naquelas horas devia estar no banheiro dando um tempo. Surprise. Ele estava conversando com a morena, em separado. Sucesso pra ele, é novo, boa pinta, merece, merece. Se conseguir o telefone dela pode se considerar sortudo. Ele estava beijando a morena... e passava a mão na barriguinha dela. Por um minuto virei fã dele.
Vou dar umas voltas por aí. Vou ver o meu. Pescocei uma
menina, vestida de vermelho, que estava na beira da escada. Sua provável
amiga estava se amassando com um cara, ao lado dela. Bom, já que
ela está de vela mesmo vou chegar e, azar no emprego, sorte no amor
(segunda pérola). Subi um degrau e encostei minha boca no ouvido
dela. Com a voz de locutor de AM falei:
— Como é seu nome?
* Ma... (sei lá o quê)
( o segurança me deu uma antenada nas costas e falou que não
era permitido ficar ali)
— Desculpe, mas não ouvi o seu nome.
* Masdamdsmdas (impaciente)
(o segurança me dá outra estocada com a antena daquele
rádio filho da puta dele)
Encarei o segurança e ele me encarou. Suas orelhas inchadas
não negavam seus dotes marciais. Seus olhos falavam: só eu
e você no mano. Diga: sim, por favor
Virei rapidamente para a menina.
— Parece que o segurança não quer que a gente converse.
* Ainda bem. (cínica)
(Então derreta vela de macumba)
Desbaratinei dois minutos, mirei o banheiro e fui. Meu amigo me parou
no meio do caminho.
* Olha esta é a Camila.
— Oi Camila, tudo bem? ( você tem uma amiga sobrando aí
na bolsa...serve um emprego)
* Tudo.
E meu camarada continuou.
* Eu e a Camila vamos embora. Ela tá de carro e vai me dar uma
carona. Beleza?
— Beleza. Vou dar mais um tempo por aí. (E era o fim da dupla
Danilo e Danojo)
Abordei mais duas meninas “chegáveis”, uma era namorada do guitarrista da banda e a outra uma transeunte ausente. Tentei me enturmar com o pessoal do aniversário do segundo andar. Cantei parabéns, dei um beijo na aniversariante e comi um pedaço da torta de amendoim. Puxei um segundo parabéns. Ninguém me acompanhou. Sumi.
Olhei para a mesa da Jussara. Já tinha ido embora.
“Um pescador tem dois amores, um bem na terra, um bem no mar” (Dorival
Caimmy). Então joga a porra da tarrafa na pista de dança.
Nada. E joga de novo. Dois cascudos. Separa pro final. E a banda parou
de tocar:
* Boa noite galera, até a próxima, se Deus quiser.
Rapidamente o pessoal se dissipou. Os caixas ficaram lotados. E começou
a rolar um play back. As duas moças pelo qual havia me interessado
estavam ali ainda, conversando com três caras. E eu encostado com
a barriga no balcão. Uma delas veio até o bar, pegar as sandálias
(a simpática estava descalça). Perguntei para ela, com a
cara da última má intenção que me restou:
— Oi, como é seu nome?
* Marilda.
— Você dança bem Marilda. Te vi dançando a noite
inteira. (estique a mão que eu vou)
* Pô, legal.
Não sei porque cargas d’água acabamos entrando em papo
de cappucino e aí a coisa fluiu. Os três caras foram embora
e a amiga dela chegou. E começou a falar e não parava mais.
Falou de sua profissão, que morava sozinha, que tinha que trabalhar
dali a três horas, que uma moça do prédio dela tinha
se suicidado e tralalá. De repente, para cortar a gralha virei um
gentleman.
— Vocês moram onde? (só tenho um décimo de tanque)
* Moramos aqui perto. Mas vamos de a pé.
— Não, eu faço questão de levá-las. Tá
decidido.
As duas fizeram cu doce, mas aceitaram. Estava meio desconfiado se
ia sobrar alguma coisa para mim. Pagamos e fomos até o carro: a
gralha sentou no banco de passageiros e a outra sentou lá atrás
(pelo retrovisor ela parecia tão longe). Pedi desculpas pela bagunça
no carro (tinha uma corneta verde que eu preservava desde a copa de 98)
e decidimos comer cachorrão no viadinho.
Paguei com os cincão que sobrou do bar. “E todos se saciaram
e regozijaram”. Quiseram saber mais sobre minha vida. O que eu estava fazendo
sozinho? Entramos no papo de namoro. A moça de trás
tinha acabado com o namorado. Falei que tinha terminado com a minha. Coisas
da vida. O papo me bateu uma deprê. Porra, mas naquela hora,
pelo menos, não estava só. Podia rolar alguma coisa (quem
sabe uma suruba com capuccino). Foi aí que a gralha falou que bebia
mijo e que fazia bem para a saúde. Aí perdi o tesão
por completo. Acelerei o carro e deixei elas no prédio. Na saída
a gralha ainda juntou umas duzentas moedinhas para pagar o cachorrão.
Nãããooooo. Disse:
— Não, não, não. É pela nossa amizade.
(doente)
Dei um convite para cada uma para a “Noite dos fudidos” e zarpei.
Parei na minha garagem no prédio. Botei a cabeça no volante
e antes de começar a pensar bosta lembrei que tinha o canal 21 da
net, com a imagem toda distorcida, mas com áudio perfeito: put-me,
put-me, fuck-me, yes, yes... Foi ali que terminei minha noite. E olha que
ainda tinha pela frente que agüentar o Pedro Bial falar num final
de domingo: “Boa Noite. Saúde e paz, o resto a gente corre atrás”.
Zero Ramalho