Edna abandonou-me após vinte anos de casamento. Cansou de meus excessos. Eu ando nos bares, encho a cara, devoro gatinhas de menos de dezoito anos. Nunca gostei de mulher madura, sei que é um defeito, mas quem não os tem? De uma certa forma, creio que nunca lhe fui infiel, afinal não levei a sério nenhuma das amantes. Não gasto um real com elas, ou melhor, nada mais do que umas cervejinhas. Ela não compreendia esse assanho masculino, essas coisas de homem, vivia de mau humor, discutia por besteiras e no dia de nossas bodas, um domingo cinzento, ao acordar as duas da tarde, com uma bruta ressaca, deparei com Edna arrumando as malas com a ajuda da mãe, uma megera impossível de trocar duas palavras. “Deixo-o”, disse. Não abri a boca. “Não quer saber o por que? Você é da turma de Heleninha Roittman”, alfinetou a sogra. Heleninha-o-quê? Dá para agüentar uma velha lembrando de um personagem de telenovela de quinze anos atrás? Continuei dormindo, a vida seguindo igual. Os dois filhos ingratos acompanharam a mãe, a empregada também deu o fora, deixando-me sozinho na casa recém-construída. Os amigos festejaram, era o último casado, todos haviam passado por um divórcio e, alguns, não suportaram tampouco o segundo casamento. Confesso que muitas vezes me parece triste a casa vazia, desarrumada, roupas espalhadas, comida por fazer, mas como dizem que mulher não é criada, ela não faz falta por outros motivos. Na verdade, nem sei como as mulheres sobrevivem no mundo de hoje. São tantas por todos os lugares, sobrando, loucas por rola, histéricas, descontroladas, amargadas na solidão. Um homem de minha idade, aos quarenta e oito anos, consegue qualquer garotinha de quinze. Elas fingem acreditar em tudo o que a gente promete, arquitetando imediatamente um matrimônio. O que a mulher deseja é uma casa, filhos e um idiota que possa apresentar como “o meu marido”. Essas são as modernas, as feministas, as libertárias. Esta noite marquei encontro com uma ordinária, mas as ordinárias são de outra classe: as fêmeas mais interessantes do mundo. Elas estão nas capas da Playboy, nos programas de tevê, nas praias e nos bares. Quando conheci Geórgia, durante a festa de Santo Antônio, não se fez de difícil, como é comum inicialmente, e sentou-se na nossa mesa. “Um brinquedo do cão”, comentou um amigo bêbado. Fez que não ouviu, sorriu, mostrando lindos dentes brancos, e contou do trabalho como enfermeira, das horas que perde tratando o cabelo, das telenovelas favoritas e de propostas de casamento recusadas. “Não nasci para o casório. Não quero ficar gorda na beira de um fogão”, filosofou, e eu e meus amigos concordamos. Quando pediu licença e foi ao banheiro retocar a maquilagem, falamos do rabo generoso, da boca carnuda boa para “aquelas coisas” e da voz sacana, ardente, cheia de intenções maliciosas. Voltando, tomou um gole de cerveja, e levou a mão à boca. O rosto se transformou. Baixou a cabeça e procurou algo no chão. “O que está acontecendo?”, perguntamos. Ela mostrou a prótese dentária numa das mãos: “Encontrei”. Lavou a chapa com cerveja, encaixou-a na boca e continuou falando de desejos femininos. Noite adentro, deu-me o telefone e pediu que ligasse no final de semana. Liguei. Vou encontrar a ordinária. Os amigos gozam, não acreditam que sairei com uma desdentada. E daí? Direi: “Geórgia, você é a mulher dos meus sonhos”. Ela sorrirá contente. Que importa se os dentes são falsos? Os sentimentos também não o são? Não é assim a vida de todos nós? Ora, meus queridos, uma boa vagabunda tem o seu lugar.
Antonio Júnior