Uma floresta densa, úmida, com árvores de copas altas, camada de um tapete de folhas e terra, em forma de pasta, que amacia o caminhar. Por perto, silêncio, mas ruídos vem de todas as direções, compondo uma sinfonia harmoniosa e caótica que arrasta incontrolavelmente para a consciência de ser divino. O aroma invade a alma, dá prazer ao se inspirar, quase dissolve a vigília. Todos os cantos iluminados e visíveis, mas nada ofusca. As ondas de calor do sol intercalam as rajadas de frio úmido que parte do solo. Do ventre da floresta surge, pelas árvores, a caminhar, vulto de outro sexo, num movimento solto porém seguro, sem medo, sem interrogações, sem destoar de toda a vida que se vê. Ainda de longe é possível reconhecer o olhar familiar que nunca se viu, mas que remete pra dentro de si e acalma, aconchega. A lenta aproximação traz breve sorriso e logo um impulso de gargalhar, rodopiar, mas o olhar é imã mais forte que empurra ao encontro. O toque é perplexo, sem excitação. Ao redor, a perfeição é tal, que tudo desaparece como que encoberto pela atmosfera enigmática. Todo o tempo do mundo não é suficiente. Apertar, lamber, sugar, entrelaçar-se, parece ser a alternativa para o inviável: entregar-se pelo avesso, pelas entranhas. Após a penetração, os movimentos lentos, sem ritmo, sem controle. Cada célula do corpo parece esfregar no outro. O líquido, que escorre e lambuza, cheira forte e seduz, inundando deliciosamente os pulmões. A gargalhada, antes contida, irrompe, colorindo ainda mais a sinfonia florestal. Não tarda para os olhos cerrarem e os corpos pesarem no tapete macio e acolhedor. Nenhum músculo atua, tamanha é a leveza do abraço. Ao chegar, o escuro da noite sela o momento sagrado. Amém.
Flávio Gago Gomes