Inocente
de tudo, sem nunca antes ter amado alguém, apaixonei-me por um homem
casado. Creio que seria inevitável. Aí
estava a mão do destino.
A
mulher dele era uma megera - autoritária, prepotente, sempre insatisfeita,
a reclamar de tudo, a exigir o sangue daquele
marido infeliz.
O
medo de ser descoberta impedia-me de rir, de brincar, por vezes até
de respirar. A situação tornara-se de tal forma
intolerável que resolvi esclarecer de vez a questão e
propus-lhe a fuga, em uma carta apaixonada.
Que
ele deixasse aquela bruxa horrível que lhe atormentava a existência,
que viesse comigo, que se dedicasse só a mim, e
por aí afora eu prosseguia declarando o meu amor nos termos
mais românticos.
À
noite, ao despedir-me dele, coloquei a carta no bolso de dentro de seu
paletó; ele prometeu que a leria mais tarde, que
eu esperasse pela resposta na manhã seguinte.
Mal dormi, tanta era a expectativa.
Quando
o vi, na manhã seguinte, ela estava ao lado dele. Assim que me aproximei,
ele pôs-se a rir, repetindo para ela
trechos da minha carta.
Meu coração culpado congelou de pavor.
A decepção, a dor, a confusão...como descreverei o meu espanto? Pois ele então não me amava?
Em
meio às lágrimas, eu via os pedacinhos da carta caírem
ao chão, à medida que minha rival a rasgava devagarinho,
com um sorriso perverso.
Apagava-se o meu sol, a minha vida perdia a razão de ser, e ele... ria!
Inacreditável!
Indiferente a meus sentimentos, ele deixou a sala e saiu definitivamente do cenário.
E fiquei exposta, desamparada, vítima de uma tragédia tão antiga quanto banal.
E até hoje não compreendo como ele pôde abandonar-me assim, indefesa, ao capricho da vingança de minha mãe!
Sonia Rodrigues