Amizade

Tanto quanto no amor, há na amizade um mistério que a transcende.
Como descrever a sensação de ser aconchegado pelo outro? Como definir um sentimento que se anuncia em afinidade e aceitação espontânea?
A amizade conjuga-se na adivinhação natural do outro, mesmo se não existem palavras explícitas ou gestos reveladores. Ser amigo é um exercício que supõe cumplicidade e independência, porque é a convivência, fruto da vontade do estar próximo, ainda que o estar presente, signifique algumas vezes, respeito à solidão do outro.
Ser amigo é acompanhar a composição do álbum da vida do outro, quando nos fotografamos e somos fotografados em momentos coloridos e em preto e branco. É fazer parte da lente do outro, sem ofuscar o foco de si mesmo e daquele, a quem chamamos de amigo. É, se preciso for, sinalizar os melhores ângulos da vida, quando o outro já não se permite fotografar em novos cenários.
Quando há amizade, não existem medidas cronológicas que denunciem separações e nem tampouco os ponteiros da distância a marcarem ausências. Há encontro sempre, ainda que apenas no horizonte do pensamento, na linguagem afetiva do lembrar ou nos códigos amorosos do silêncio consentido e conhecido entre ambos.

Fernanda Guimarães