Amigos,
Querem que a gente se mantenha manso, calmo e com as orelhas caídas (para não dizer o rabo enfiado entre as pernas). Mas deixa eu contar uma história que pressenciei esses dias.
Eu estava no ponto de ônibus das Clínicas (rua Teodoro
Sampaio), 8h30 da manhã. Vi um velhinho, velhinho mesmo, magrinho,
arqueado, pedindo dinheiro. Dizia que precisava comprar remédios
e não tinha dinheiro. O velhinho pediu dinheiro para uma mulher,
bem vestida, provavelmente com um celular dentro da bolsa. Ela nem olhou
para o velhinho. O velhinho pediu para outra mulher. A mesma coisa. As
pessoas nem sequer olhavam para ele. O velhinho falando, com as mãos
estendidas, e as pessoas pareciam estátuas de mármore.
Vi quando o velhinho encostou na banca de jornais, levou as mãos
ao rosto e cobriu os olhos. Eu estava do lado. Ouvi ele dizendo, baixinho:
"Meu Deus, quanta humilhação". Repetiu isso duas vezes.
Comecei a chorar. Tirei dez paus do bolso e dei para o velhinho. Falei:
"meu senhor, dá para comprar os rémedios que o senhor precisa?
Se dá, pegue o dinheiro, compre os remédios e vá para
casa. Vá descansar." O velhinho não queria aceitar o dinheiro.
Disse: "Mas eu estou vendo que
você vai pegar ônibus. Esse dinheiro não vai fazer
falta? Me dê só 1 real que está bom".
Eu não conseguia conter o choro. Aquele velhinho, humilhado,
e ainda mantendo a dignidade! Eu chorava de tristeza e de raiva. Tristeza
pela situação em que se encontrava aquele velhinho (podia
ser meu/seu pai ou avô. É, pense um pouco: se fosse o seu
pai!!!). Raiva pela crueldade da elite filha da puta deste país,
capitaneada por FHC, que ignora a absoluta maioria das pessoas deste país.
Não só ignora como tem nojo dela, é bom que se diga.
Eu pensava no "espírito natalino" que toma conta da cidade nesta
época, nas luzinhas espalhadas por todos os lados, e via na minha
frente aquele velhinho cansado, arqueado e humilhado!!!
Dizem que estamos numa época em que não é correto
ter raiva. Não gostam de pessoas "raivosas". É preciso ser
polido, elegante, saber negociar! Mas cenas como esta, que acontecem a
toda hora, me dão raiva, sim. Muita raiva. E tristeza. Tomem um
ônibus e vejam como está senda tratada a maioria das pessoas
deste país. E depois me digam!
Espero que 2001 desperte de novo o senso de rebeldia e coragem no coração de todos.
Abraços
Ademir Assunção
ps: e vai um poema para vocês (para não pensarem que se
tratava apenas de um desabafo — embora fosse)
Raiva é Energiaa máquina que move o mundo, o tilintar
de moedas virtuais, cartões de crédito,
senha bancária, fobias sexuais, papos de velhos
sapos peludos, papudos otários dando
de espertos, mirando a terra como campo
de erros, onde crescem heras que enfeitam
os muros, enquanto monturos de gente
azedando no lixo, emporcalham a festança
dos donos de seguros, como se a vida fosse algo
seguro, como se estrelas não se acendessem
no escuro,