Neste 2002 completaria 60 anos Dona Carlinda Orlanda Sanches. Mas, aos 49 (ou 48?), Alguém lá em cima sentenciou que precisava dela. Sabia que poderia contar com.
Aqui na terra, a energia, o conhecimento e bondade de minha mãe
sempre estiveram mais a serviço dos outros do que de si mesma. Mal
de família ou herança divina.
I
Era curioso observar como pessoas necessitadas passavam direto pelas
casas das ruas em que moramos e estacionavam frente à nossa. Era
como se a antena que cada um de nós carregamos sintonizasse o sinal
positivo que irradiava dali de dentro.
II
Quando voltava do serviço, mãe dizia: "Filho, aquelas
roupas assim, aquelas coisas assado, dei a uma família cheia de
necessidades que passou por aqui." Isso fora alimentos, remédios
(conhecia muito sobre medicina doméstica), "um dinheirinho" e freqüentemente
orientações, conselhos, a palavra amiga, desinteressada.
III
Quantas vezes, no meio da madrugada, pessoas com dores, mulheres em
trabalho de parto, idosos que acidentalmente tiveram queimada a pele inteira,
crianças chorando desbragadamente e pais desorientados sem saber
o que era e o que fazer; quantas vezes as orientações para
a mãe de primeira vida; quantas vezes tudo isso e muito mais e Dona
Carlinda (linda até no nome) era chamada para o aconselhamento honesto
e correto, as primeiras e mais urgentes providências até o
encaminhamento ao médico, que ela, pressurosa, logo recomendava
ou providenciava. Para muita gente, era "Deus no céu e Dona Carlinda
na terra".
IV
Desde que Deus a levou, começo a acreditar que para o céu
vão também almas carentes, aflitas, desesperadas, e que continuam
assim, embora no Paraíso. Acredito nisso porque senão não
tinha sentido a mãe ser levada lá pro Alto assim tão
jovem. Dona Carlinda não sabia fazer outra coisa senão o
bem para o próximo, para o distante, para os amigos e principalmente
para desconhecidos.
V
De modo que, se não tem gente no Céu passando dificuldades,
é bom o Todo-Poderoso cometer um daqueles milagres que ele faz com
tanta facilidade e devolver logo minha mãe aqui pra terra. Tem muita
gente aqui precisando dela. Inclusive nós, seus filhos.
VI
Perdão, Deus, molestar o senhor aí em cima com pedidos
sem sentido. Mãe, nestes dias mortos, sabendo-a rediviva cá
dentro de mim, seu filho lhe pede desculpas, e a bênção.
Mas ainda chove muito dentro de mim.
Edmilson Sanches