É o fim?
 

Capra, autor do Ponto de Mutação, diz que na vida passamos por alguns  momentos chamados de ponto de inflexão. O que significa isso? Usando as idéias matemáticas, ele discute a idéia fundamental por trás do conceito. Dado um trecho de uma curva específica podemos encontrar um ponto de tangência e existe uma (e apenas uma) reta  que passa por  esse ponto. Se essa reta for crescente, estamos em trecho crescente da curva. Se encontrarmos uma reta decrescente, a curva também o é. Assim, sabemos se a curva está “aumentado”, crescente, ou “caindo”, decrescendo. Os pontos de inflexão são aqueles em que a reta que tangência é nula. Não dá para saber, pela reta, se a curva está crescendo ou não. É preciso olhar a curva.

            Daí o autor apresenta a seguinte idéia: existem pontos da vida da gente que são exatamente iguais a esse. Não sabemos se estamos em movimento crescente ou decrescente. Precisamos olhar a vida e não para o ponto. Mas, isso não é fácil. Como olhar para o futuro?

           Estou me se sentindo assim. Fiz meu décimo quinto exercício e, teoricamente, terminei meu curso de roteiro. E agora, para onde ir? Nesses meses que fiz o curso vivi um momento crescente. Significou o meu reencontro com o meu desejo quase infantil de criar histórias, fantasias e mergulhar no mundo da literatura, dos personagens, das tramas e, no caso da telenovela,: dos ganchos, breaks, tipos de cenas, tipos de efeitos especiais... Nesses últimos dias assisti novela não apenas por lazer, mas encontrei aquele olhar que tem, por exemplo, o estudante de engenharia que vê a ponte que está sendo construída na sua cidade. O olhar dele não é apenas do significado/sentido, engloba muito mais, por entender de organização, das madeiras usadas para reforçar a construção, do tipo de cimento, do tempo... Igualmente, minha visão ampliou-se e, ainda melhor, assisti novela sem culpa! Diverti-me! Além de ser, também, um momento de ensino-aprendizagem.

            Reconheço que fui extremamente feliz em encontrar você, Leila. Não tenho como negar isso. Acho que tem coisas que nos fazem, realmente, pensar que existe alguém ou alguma força que olha e cuida de nós. Queria tanto fazer esse curso e dei de cara logo com você! Com sua exigência, o seu humor, a sua dureza de alguns momentos, a maleabilidade de outros e, principalmente, a sua genialidade e inteligência.

            Eu era uma daquelas pessoas que sonhava e planejava histórias quando dormia. Criava livros, histórias, contos, textos, crônicas... Com o curso passei a gostar de ficar horas rolando na cama antes de dormir, eagora ficava sem culpa, sem medo de imaginar que eu devia sofrer de algum problema por ficar imaginando histórias fantasiosas e fictícias.

            Durante o curso ficava pensando nos exercícios, nas tarefas o tempo todo: quando dirigia, quando fazia ginástica, quando estava à toa... Fiquei compulsivo.

            Agora estou em outro momento: o curso acabou. Que medo! Tenho medo de voltar a ser aquilo que era. Voltar a não ter exercícios, histórias para criar, cenas para fazer, diálogos para desenvolver e curtir ficar pensando nas histórias antes de dormir, sem culpa! Tenho medo da rotina diária. As tarefas do dia-a-dia nos fazem esquecer dos sonhos, das criações... talvez a vida seja dura demais com os artistas.

            Não tenho conseguido pensar em uma história. São tantas. E por onde começar: bater de porta em porta? Em qual porta? Aonde? Quando? Tenho que ter o que apresentar? Devo sempre andar com um projeto debaixo do braço?

            Esse é o meu momento de inflexão. E ele me dá medo! Muito medo! Alguns sentem medo do escuro pois imagina que possa ser atacado. Outros de altura, pois acham que podem cair. Pois eu tenho medo de deixar de criar histórias...

            Quantos alunos já dei aula e já estão no mercado de trabalho. Eu ajudei até onde pude, dei o conteúdo, o melhor de mim e eles foram embora. Uns foram, outras voltaram e outros nunca mais vi. Engraçado, não senti medo quando terminei minha graduação (nem a pós), pois já estava inserido no mercado. Sabia por onde as coisas corriam, pois minha mãe era professora e o espaço escolar era um local de trabalho e extremamente familiar. Agora, porém, é diferente, estou diante de minhas incertezas.  Não tenho nada. Talvez algum talento, mas que se não continuar a ser trabalhado, de nada vale! Por isso sinto medo.

            Por quê estou dizendo isso? Porque preciso escrever! Escrever... Pensar essas palavras foi meu décimo sexto exercício. O que virá após isso?

            Obrigado Leila pelo seu carinho e amizade. Seus e-mail´s foram esperados com ansiedade. Saiba disso! Foi muito bom lê-los. Sou uma outra pessoa.
 
            Espero que meu ponto de inflexão seja para um momento crescente. Não sonho escrever a novela das oito... sonho em escrever, escrever e escrever. Ver uma cena indo ao ar e ver que minha vida teve um significado, fechou-se um ciclo: as histórias que criava e inventava no quintal de casa, debaixo da goiabeira me fez um escritor, um criador de histórias humanas. Escrever para mim é um exercício de humanidade. É entender o homem. É levar àquela mulher que assiste a novela enquanto cozinha, a pensar, por segundos que seja, naquele tipo de conflito, o que pod ensejar com que ela se torne uma pessoa melhor. Aí sim, nesse momento, terei a certeza de não estar em uma inflexão, mas sim de estar crescendo.
 
            Obrigado!

Celso Oliveira Faria

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