Hoje decidi que amanhã
não vou fazer 52 anos: assumirei minhas 52 asas. Vou mergulhar rasantes
sobre o mar de Ipanema e aterrisar no Pier com 21 asas. Não me valerei
de nenhum freio, afinal, com 21, quem deles necessita? Serei perdulária
e me valerei de mais duas, só pra tomar um porre no Lamas e
repousar a bebedeira sobre as páginas do Livro Vermelho de Mao e
as folhas desgastadas do Écrits, de Lacan. Depois, mal sustentando
as pernas, recolherei 8 asas e ganharei um beijo do menino sardento (seria
Felipe, Luis ou Luis Felipe?) nas escadas do prédio, entre o segundo
e o terceiro andar. Mas desta vez não ficaremos presos pelos nossos
aparelhos ortodônticos e escaparei da vergonha. Não temerei
uma provável gravidez já que terei a ciência da décima
terceira asa que, apesar de odiar a monotonia científica da professora
Célia, me garantiu que beijos não engravidam. Já
devidamente tranquilizada, vou inventar uma nova matemática e das
13 asas pularei para a décima oitava. Empinarei o nariz e sobrevoarei
as salas do velho IFCS (Instituto de Filosofia e Ciências Sociais).
Não assistirei as aulas de Lógica Matemática e desta
vez não levarei bomba. Repetirei ad eternum as aulas de Metafísica
e recitarei Aristóteles de trás pra frente (Platão,
dividirei com os mais íntimos). Nos corredores, de preferência
no da cantina, tramarei revoluções, mas desta vez optarei
pelas estéticas. Está certo, confesso, ainda acredito no
povo no poder, mas o que fazer quando as 34 asas sobressalentes me filiaram
ao partido do Belo e me repetem que a arte unida jamais será vencida?
Mas não importa, com a arte no poder, o povo está junto.
Amanhã, quando a
próxima asa encaixar nas minhas costas, o tempo não terá
nenhuma importância. Vou ir e voltar na hora que me der na veneta.
Serei idosa sem tempos idos.
Marcia Frazão