Fico amargurado quando cai um avião. Qualquer acidente com vítimas fatais provoca amargura, eu sei. Não sou diferente de vocês. Mas acidentes com aviões me impressionam mais, não só porque geram muitas vítimas de uma só vez. É mais do que isso.
Aviões que caem trazem um quê de magia desfeita. É como se um Mister M aeronáutico qualquer resolvesse mostrar para o mundo como funciona (ou deixa de funcionar) a mágica dos vôos. Desculpem se exagero. Definitivamente, fico desolado com acidentes de aviões.
As estatísticas mostram que os desastres aéreos matam menos do que o trânsito terrestre. Aviões são máquinas caríssimas, na maioria dos casos bem conservadas e pilotadas por profissionais altamente capacitados. Mas não é esse aspecto que me fascina.
É difícil explicar.
Os aviões transportam meus sonhos desde pequeno. Em meu imaginário infantil, voar era embarcar no futuro. Talvez por isso, quando passava em frente do então Centro Técnico da Aeronáutica em São José dos Campos, ainda menino, imaginava ficar ali um dia, como aluno ou militar de carreira.
Mais tarde, li Saint-Exupery e voava na carlinga de seus textos, dividindo com ele os momentos fantásticos de flanar pelos céus - generoso piloto que dividia com os leitores suas experiências de vôo.
Infelizmente, não virei aeronauta. Na definição das rotas de minha vida, fui voar em outros céus. Hoje, piloto letras. Projeto aviões de palavras. Mas não deixo de me encantar quando vejo um avião em pleno vôo.
Sou do tipo que vê um avião passando e ainda se surpreende
diante daquele bichão flanando no ar. Não raras vezes, já
me peguei pensando: “como é que uma coisa dessas consegue ficar
lá em cima?”. É bobo, eu sei, mas não consigo evitar.
Os aviões passam e eu ainda sonho.
Quem sabe os aviões sejam tão seguros porque outros sonhadores como eu endereçam sonhos às nuvens através dessas naves surpreendentes. Em um esforço coletivo, sustentamos vôos. Pois os sonhos são mais leves do que o ar. Talvez por isso, fique especialmente triste quando caem aviões. Derrubam-se com eles os sonhos de todos aqueles que voam sem poder voar.
Maurício Cintrão