Scliar: mais que um nome
Em meio à solidão dos meus dias paulistanos, o domingo me chega nublado. Recebo dezenas de e-mails acerca de um homem batalhador que nos deixa de luto.
Domingo: em meio a tantas buscas e repensando os (des)lugares, não imaginei que – repentinamente - me vestiria de uma saudade tão forte, imortal. A saudade, a luta, o luto sugerem (nas boas palavras de Daniel Munduruku) que Scliar é mais que um nome.
Domingo: uma lembrança me chega. Vi o Scliar apenas uma única vez. Recordo que me sentei ao seu lado, quase desacreditando do momento mágico que Ñanderu/Deus/Tupã e todos os deuses me permitiram vivenciar. Dou graças pela oportunidade que tive ao compartilhar da mesma mesa com Moacyr Scliar, Daniel Munduruku, Darlene Taukane, Cícero Sandroni e Alberto Costa e Silva no I Colóquio Tradição Oral e Literatura Brasileira, na Academia Brasileira de Letras (ABL), à tardinha do dia 15 de junho de 2009, no Rio de Janeiro, dentro da programação do VI Encontro de Escritores Indígenas.
Domingo – tarde da noite escrevi ao parente Munduruku para falar da falta que o Sclair nos faz. Ele, Scliar, era um judeu imigrante que distendeu seu olhar de médico sanitarista aos índios; um olhar demasiadamente humano e que a exemplo de Nutles, ele também descobriu que nós indígenas sofremos a dor do holocausto a que fomos submetidos, quando nos fizeram vestir roupas de variolosos. Ao vestir essas roupas – como denuncia Scliar – muitos índios morreram para que os posseiros dominassem a nossa Mãe-Terra. No I Colóquio Tradição Oral e Literatura Brasileira, Scliar revelou que a sua identificação com o índio se deve ao fato de que ele também faz parte de um grupo humano perseguido. E é reiterando seu pensamento em torno da construção de um mundo possível que destaco o seguinte:
“Nosso parentesco deriva da consciência da marginalização. Somos povos de memória e isso nós temos em comum. Nosso testemunho é, portanto, para que a gente seja um país melhor” - Scliar.
São Paulo, tempo nublado, 28 de fevereiro de 2011.
Graça Graúna