Colhemos o que plantamos

                É quase consensual, em todo o mundo, a condenação aos atentados terroristas sejam de natureza fundamentalista, religiosa, política ou simplesmente por delinqüência. Eu também participo desta universal condenação ao terrorismo que vem envolvendo todo o mundo numa teia de amplitude incomensurável e incontrolável.
                Mas, no caso mais recente, a série de explosões e seqüestros de aviões suicidas nos EUA vejo a necessidade de fazer algumas ponderações. Primeira: os terroristas que atacam a população civil estadunidense não são automaticamente ou necessariamente de origem externa. Tais terroristas podem estar engrossando as fileiras da chamada “direita americana”; podem ser discípulos das idéias anti-tecnológicas de Unabomber (os atentados ocorridos em 11 de Setembro de 201 atingiram os símbolos máximos do complexo industrial militar e financeiro norte-americano: suportes e sustentáculos do presente avanço tecnológico dos EUA); podem ser seguidores dos detonadores do prédio público explodido em Oklahoma; podem ser membros de seitas apocalípticas ou de fanáticos que queiram jogar a culpa em  muçulmanos ou em judeus ou que estejam nos ameaçando com a configuração potencial do tão apregoado ou vislumbrado Armagedon; etc.  Pode estar dentro do próprio e poderoso reino do tio Sam o inimigo oculto. Por que não?
                Se fizermos um rastreamento historiográfico da presença estadunidense no cenário internacional nos últimos duzentos anos verificaremos o caráter intervencionista da sua política externa; o oportunismo calculista dos seus decisivos posicionamentos militares nas duas guerras mundiais que arrasaram a Europa e grande parte do mundo contemporâneo no século XX; a ousadia irresponsável dos americanos na América Central, no Vietnã, em Cuba e em muitos outros pontos do planeta, o que parcialmente explica o crescente e forte sentimento antiamericano em todo o mundo (inclusive na Europa dos nossos dias).
                Muitos países europeus, asiáticos e africanos com passado imperialista, colonialista ou intervencionista em suas histórias ou em suas relações internacionais há várias décadas se tornaram alvos previsíveis de grupos e de ações terroristas. Entre estes países podemos incluir a Inglaterra, a França, a Alemanha,a Rússia, a Bélgica, a Espanha, a Itália, o Japão, a China, alguns países do norte da África (como a Líbia, o Egito, a Etiópia, etc.) e do Oriente Médio ( Israel, Síria, Turquia, Irã, Iraque, etc.). Estes países, em suas histórias, acumularam (por séculos e até por milênios) pesos crescentes, rancores de vizinhos e de povos de outros continentes ou distantes (entre os quais até hoje colhem ódios irreversíveis e lhes renderam desuniões e divisões internas). Esta assertiva não revela, da minha parte, qualquer revolta ou ressentimento contra países ricos e poderosos de vários continentes deste mundo. Para provar e fundamentar o que acabo de afirmar cito uma série de países riquíssimos e com ótima qualidade de vida e que não foram nem são alvos de ataques terroristas. Por exemplo: Finlândia, Noruega, Suécia, Dinamarca... e, talvez, mais alguns países europeus e asiáticos.
                Além disso ou somando-se a tudo isto temos agora nos EUA um presidente da República cuja eleição ainda não é amplamente considerada legítima; um governo internacionalmente antipático por se recusar a assinar alguns tratados internacionais referentes ao equilíbrio climático e ambiental em todo o globo; uma globalização que avança nitidamente identificada com os interesses norte-americanos (ou com a clara hegemonia econômica, cultural e política dos estadunidenses); uma notável e até certo ponto antiga insensibilidade do governo e do complexo industrial e tecnológico americano no que concerne aos problemas sociais internos (migrantes e minorias étnicas, pobreza absoluta e mendicância, disseminação do tráfico de drogas e do consumo de drogas, mais uma alarmante e cinematográfica criminalidade e mafiosidade) e dramas de populações que vivam além das suas fronteiras; frieza interesseira e capitalista diante da questão das patentes dos  caros medicamentos anti-AIDS; uma relativa omissão diante dos graves problemas balcânicos, paquistaneses, tibetanos, indianos e do Oriente Médio e uma indiferença absurda frente as crises econômico-sociais das “democracias” latino-americanas e ainda um silencioso e cínico “dar de ombros” à fome e à AIDS que dizima dezenas de milhões de africanos. Tudo isto me faz pensar que o povo americano (parcialmente eleitor de Bush) esteja pagando caro pelos atuais procedimentos governamentais do seu país. Ou os inocentes pagando pelos “pecadores”. Uma hipótese a ser considerada, por que não?

José Luiz Dutra de Toledo


 

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