Emílio de Menezes

Como não existia televisão e ter rádio não era coisa comum, os versinhos do Bilac e do Emílio de Menezes (1866-1918) e de outros eram os "jingles" comerciais da época. Emílio de Menezes escreveu 365 quadrinhas —  uma para cada dia —  para a Cerveja Brahma, e muitas sobre cigarros da época, sonetos sobre remédios ("A Saúde da Mulher"), chapelarias , etc.  Estes poemas às vezes são difíceis de entender por causa das referências a coisas da época. Dou abaixo alguns exemplos das quadrinhas  da Brahma e dos cigarros e um soneto curiosíssimo pela sua atualidade. [Em “Obra Reunida” de Emílio de Menezes,  José Olimpio Editora, 1980.]

Quadras encomendadas pela Cervejaria Brahma:

Escrito no dia 15 de dezembro

A José Bonifácio se insulava
Nessa linha pitoreca,  Paquetá!
Lugar que a água de coco dominava
E a BrahmaPorter dominando está.
 
Escrito do dia 21 de fevereiro:
O pintor Victor Meireles,
Que faleceu nesta data,
Dizia que ao próprio Zoelller
Já era a cerveja grata.


Escrito no dia 11 de abril

Nesta data morreu Macedo,
Autor do Moço Loiro e Moreninha.
Quando o releio penso em segredo:
Um chope loiro e um copo da Negrinha.


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Quadras sobre cigarros “Odalisca” e “Excelsior”

Quando a tempestade aumenta
O raio no espaço risca
Esta sentença: “A tormenta”
Cede a um cigarro Odalisca.
 
Do alto do céu demande o rumo
O aroma que o cigarro tem.
Porém o odoroso fumo
Do Excelsior vai muito além!
 
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Conflagração Européia
(A Guerra dos Balcãs contra a Turquia)

Que tombe enfim toda a selvageria
Que Europa avilta e que o progresso entrava,
E sobre a vil e bárbara Turquia
De fogo caia a vingadora fava!

Que os balcânicos povos, à porfia,
Ergam em cada heróica mão a clava,
Contra a rotina, o atraso, a barbaria,
Do sangue em que a Otomânia hoje se lava!

Se a Bulgária rugindo, o povo exorta,
O Montenegro o pavilhão desfralda
Sobre os destroços da Sublime Porta!

Da Sérvia à Herzegovina o ardor escalda,
Porque esse povo forte e unido importa
Manteiga do Brasil, marca Esmeralda!

Este soneto é curioso também pela sua atualidade. Quem se lembrar da primeira declaração de bin Laden, após o início dos bombardeios americanos, terá ouvido a parte em que ele lamenta os “oitenta anos de humilhação do Islão”. Ora, na época, os especialistas levaram algum tempo a identificar que “oitenta anos” eram estes. Depois viram que se tratava da dissolução do Império Otomano, última marca da dominação islâmica na Europa (no caso, Turquia). Isto se deu em 1918 e a guerra a que Emílio de Menezes se refere é esta. A “humilhação” para bin Laden teria sido a derrota de 1918, a mesma que, sentida também como humilhação por Hitler, acabou levando à Segunda Grande Guerra. Emílio de Menezes estava totalmente contra o Islão, que chama de “selvageria ” e “rotina, atraso e barbaria”. A Sublime Porta é a entrada do Palácio Imperial em Constantinopla (Istambul) — lembro-me de a ter cruzado para visitar o harém, alguns anos atrás.

Marlene Andrade Martins

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