Ponto de vista

Quando do suicídio de Getúlio Vargas na madrugada de 24 de agosto de 1954, no mesmo dia, em sessão do Congresso Nacional, o Deputado Gustavo Capanema, fez o pronunciamento de exaltação do presidente com estes termos:
"Sr. Presidente, não é este o momento próprio para tratar da vida do Presidente Getúlio Vargas. Esta vida foi marcada pelo ideal.
Conheci de perto o grande Presidente, conheci sua inteligência profunda, larga, sutil, inteligência política como nunca vi tão grande, capaz de discernir as melhores soluções nos momentos mais intrincados; capaz de divisar no plano dos interesses do pais, as soluções salvadoras; capaz de encontrar em todas as circunstâncias políticas em que estivessem em jogo a honra, o destino, a felicidade da Nação, o rumo popular ou o rumo histórico, o rumo verdadeiramente cheio de sabedoria.
Ele tinha essa inteligência alta e notável. Conheci-lhe de perto o coração. Nunca vi no seu semblante, em nenhuma circunstância, a menor sombra de rancor, de ódio, de antipatia, de aborrecimento com quem quer que fosse.
... Ele tinha, alem dessa inteligência e desse coração, uma vontade de ferro. Para o maior número de problemas ele admitia uma série de soluções. Não era teimoso, não era vaidoso, não se apegava à sua própria deliberação.
Para o maior número de assuntos ele admitia um sem - número de boas soluções. Ele colocava a sua conta e apenas num pequeno número de problemas ideais e ai sua vontade era realmente de ferro.
Neste ponto é que nele surge e se caracteriza o homem de estado. O homem de estado não é aquele que apenas tem um grande coração, não aquele que apenas tem uma grande inteligência. O homem de estado é aquele que tem uma grande e poderosa vontade, essa vontade capaz de enfrentar os problemas mais difíceis e alcançar os objetivos.
Essa era a sua vontade.
Mas, Sr. Presidente, eu dizia que sua vida foi marcada pelo ideal. Esse coração, essa inteligência e essa vontade poderiam ser qualidades de um condutor qualquer de grande categoria. Nele esses atributos fundamentais foram reunidos para servir a um ideal. Ele pôs toda a sua vida a serviço de um ideal.
Poderíamos ficar aqui longo tempo a indicar as linhas mestras desse ideal: A felicidade do povo, a unidade nacional, a glória da pátria, um sem - número de princípios e de objetivos que hão de constituir, daqui por diante, vasto campo de pesquisas e de trabalhos e de trabalho dos biógrafos e historiadores.
Do que neste momento devo falar é da morte de Getúlio Vargas.
Se sua vida foi marcada pelo ideal, sua morte foi marcada pela honra. Isto é o que deve ver, neste doloroso momento, o povo brasileiro... Assisti nestes últimos dias todo o drama da sua alma, desde aquela madrugada tenebrosa em que sucumbiu o Major Rubem Vaz e em que um jornalista foi atingido em sua liberdade.
Desde aquela madrugada o presidente não perdeu a inquietação e o sofrimento. Disse-me a certa altura dos acontecimentos que seus maiores inimigos já eram os autores do atentado da rua Toneleros.
O presidente porfiou a partir dos primeiros momentos, para que os criminosos fossem punidos... O que lhe importava era que os criminosos fossem descobertos e a fúria da justiça sobre eles recaísse.
Ainda ontem, quando, as duas horas da tarde conversávamos pela última vez disse-me que a questão de ficar no governo lhe parecia secundária. A questão estava em defender a sua honra... Não posso sair daqui enxovalhado. Não posso sair daqui desonrado. Não posso sair daqui com a pecha de condescendente ou vinculado com o furto e o homicídio. Tenho de ficar aqui enquanto for necessário para a defesa do meu nome."
São estas em resumo as palavras de Gustavo Capanema na morte de Getúlio Vargas.

Fahed Daher  (*)

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(*)  Médico - Membro da Academia de Letras Centro - Norte do Paraná - Apucarana

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