O teatro está vivo
Hoje é dia de falar em teatro. Digo isso porque fico meio aborrecida quando ouço alguém dizer que não existe teatro na cidade. Foi o que ouvi um dia desses numa roda de amigos, quando se discutia a antiquíssima questão de "para onde é que vamos hoje à noite?" que invariavelmente termina com as pessoas decidindo ir a um bar ou restaurante "porque em Natal não tem para onde ir". Acho tudo isso de um esnobismo sem par. Acho que devemos parar de ficar sonhando com São Paulo ou Nova Iorque, e aprender a curtir as coisas que são nossas, que temos aqui na nossa terra. Temos música, literatura, teatro, shows. Temos o que ver e para onde ir. Mas é mais chique, mais "blasé", dizer que não, que na cidade nada acontece, que o tédio é mortal, que a província é sem graça e desinteressante.
Há muito tempo que faço teatro e literatura nesta minha cidade Natal. Nunca tive pretensões de ir para Rio ou São Paulo, e muito menos de que o meu teatro fosse "notado" pelas grande redes de televisão. Meu público está aqui, entende minha linguagem, está interessado nas coisas que eu quero dizer. Se, por acaso, alguém "de fora" se interessar e quiser ver meu trabalho, ótimo, que seja bem-vindo. Mas eu escrevo e enceno para o povo da minha terra, porque considero essa a única maneira de tornar-me universal.
É pena que fiquemos sonhando com as superproduções, cópias dos grandes musicais da Broadway, que estão em cartaz nas principais capitais do país. Enquanto sonhamos com esses espetáculos, que jamais virão por aqui, deixamos de assistir a "João e Maria" (Casa da Ribeira, 30 e 31/07); "Couro de Piolho" (Teatro Alberto Maranhão, 31/07 e 01/08), "Ópera do Malandro" (Escola de Música, 30/07), "O Casamento de Fígaro - trechos e outras peças" (Escola de Música, 12/08), e muitos outros espetáculos de música, dança e shows que acontecem em outros espaços da cidade, incluindo a programação do projeto Nação Potiguar, do projeto Seis e meia e do Seaway Shopping.
Voltando à questão do teatro, 25 projetos teatrais receberam a verba do Auxílio Montagem, do Teatro Alberto Maranhão, o que significa que 25 novas peças estarão em cartaz até janeiro de 2005. Vai ter início também um projeto de teatro na Casa da Ribeira, com o apoio do Banco do Brasil, onde novos grupos serão incentivados e terão seus trabalhos encenados. No interior do estado, Casas de Cultura estão sendo criadas, oferecendo espaço para apresentações mas, sobretudo, funcionando como polo concentrador e irradiador das atividades culturais dessas cidades. Em Mossoró, há cinco teatros funcionando. Em Macau, três teatros. Voltando a Natal, duas oficinas de teatro foram iniciadas nesta semana no Centro Experimental (ali, no antigo Aero-Clube), sob a orientação de João Marcelino. No Departamento de Artes da UFRN, cerca de dez espetáculos de conclusão de curso dos alunos da disciplina de Encenação III foram apresentados entre 11 e 16/08, com destaque para "O Homem de Cabeça de Papelão", um conto de João do Rio adaptado e dirigido por Lilian Negão, da Família Marmota de Teatro e "O Marinheiro", de Fernando Pessoa, dirigido por Keila Fonseca.
Ainda falta muita coisa. O teatro, como qualquer atividade cultural, precisa do público, precisa do apoio institucional do governo e precisa também da iniciativa privada. As empresas, com seus mecanismos de patrocínio e apoio, embasadas nas leis de incentivo, são fundamentais para esse processo e os artistas precisam estar sempre disponíveis para estimularem a formação de novas platéias através de espetáculos gratuitos ou a preços reduzidos.
Estou animada, meu caro leitor, com as perspectivas teatrais para os próximos meses. Aguardo com ansiedade as estréias do "Caldeirão", do grupo Teatral Alegria Alegria, e de "Flores de Plástico", do grupo Ditirambo e vi boas idéias em "Lisístrata", do grupo Dionísias. Estarei também mostrando "Alguém Lá Fora", texto meu que estou dirigindo e que estréia em 30 de setembro na Casa da Ribeira. Enquanto isso, até o final do ano o grupo Teatral Ô de Casa apresenta o seu novo trabalho, também com direção minha.
Nós, artistas, estamos produzindo. Faltam somente mais projetos do governo como o "auxílio - montagem", uma lei estadual de incentivo que atenda aos anseios da classe artística e mais sensibilidade das empresas privadas comprando junto com os artistas a briga da cultura, entendendo que o produto cultural é a melhor vitrine para sua marca. O resto nós fazemos. E fazemos como sempre: com garra, determinação, responsabilidade, amor, alegria e muita Arte.
Clotilde Tavares