Hipótese Gaia

Sou um entusiasta da ficção científica...

Desde criança, o imaginário futurista dos autores me fascina; e, embora nem sempre bem sucedidas, as versões cinematográficas acompanham essa predileção.

A claridade asséptica dos ambientes cibernéticos contrasta com a desolação devastadora das paisagens pós-apocalípticas; o uso intenso da tecnologia se alterna com uma intensa busca da espiritualidade; e o ser humano, que já era pequeno, diante de seu planeta, sente-se ainda menor perante a imensidão do universo.

Talvez por sintetizar um pouco de tudo isso, o filme "Final Fantasy" (“Final Fantasy: The Spirits Within”, EUA, 2001) - apesar de não ser nenhum clássico - exerce um certo fascínio sobre mim. Por conta disso já o vi quatro vezes; mas foi na quarta, que tive a oportunidade de aprender algo, ao menos para mim, novo.

Meu filho, Guilherme, de dez anos, ainda não havia visto o filme, e o acompanhava, como sempre, com muita atenção. Imaginei que a abordagem filosófica do filme fosse um pouco complexa - com seus espectros, imagens surrealistas e teorias telúricas -, puxei conversa sobre isso e, para minha surpresa, ele afirmou, com naturalidade, que conhecia a Hipótese Gaia, mencionada pelos cientistas do filme... Não satisfeito, foi buscar seu livro de ciências e me apresentou ao cientista britânico, Sir James Lovelock, e sua teoria, formulada na década de 1960! Continuo aprendendo com o meu guri...

A idéia de que a Terra seja um organismo vivo, sensível e inteligente, na verdade, não é nova; o próprio nome Gaia vem da mitologia grega, no capítulo: origem da Terra. “Gaea” era o nome atribuído à Terra, e seu surgimento, das sombras do nada inicial, é descrito coma a dança de um redemoinho, que se consolida e evolui como planeta. Descrições análogas são encontradas nas mitologias de várias civilizações; e o próprio Livro do Gênese retrata a criação do mundo e do próprio ser humano: formado do mesmo "barro" da Terra e animado com um "sopro" divino.

Se os átomos formam as moléculas, que constituem as células, que são a base o organismo humano, que foi feito à imagem e semelhança de Deus; não há incoerência em projetar que somos, também, parte do tecido orgânico de nosso planeta. O mesmo raciocínio vale para a Terra, em relação ao sistema solar; para este, em relação à Via Láctea; e para esta, em relação ao universo. Todos somos parte dessa incomensurável "multiplicação celular"!

Mas ao ver o filme futurista e compará-lo com o presente, veio à mente a dúvida: Somos células sãs ou cancerosas, nesse organismo? Pior: será que somos vírus?

Enquanto os povos eram nômades e dispersos, não éramos risco ao equilíbrio do meio ambiente; a fauna e a flora se reciclavam. O surgimento das aglomerações urbanas representou o início de problemas, posteriormente, agravados pelo extrativismo vegetal e mineral, e pela industrialização, desenfreados. Ainda não conseguimos equacioná-los; quanto mais solucioná-los. O resultado é continuamos caminhando, a passos largos e rápidos, para uma situação já imaginada pelos ficcionistas científicos e futurólogos: o colapso ambiental.

A preocupação dos cientistas e ambientalistas já identificou origens e soluções, mas a visão de curto prazo de nossos governantes e a ganância de empresários, insiste em postergar as providências para evitar esse desenlace, ignorando que ele não se conta mais em séculos, mas em décadas ou anos.

Os sinais são claros: extinção de espécies, exaustão de recursos minerais, desertificação, distúrbios climáticos... Todos são como tumores, que caminham, rapidamente, para a metástase e a falência do organismo.

A humanidade aprendeu a superar os obstáculos da natureza, mas ainda não conseguiu conter seu próprio instinto selvagem. Sofre as conseqüências de seus atos, mas não aprende com seus erros. Testa limites, onde não deveria; finge que não vê, ou que não é responsável pelos resultados... Mas a responsabilidade é de todos e ninguém está imune às conseqüências!

Os fanáticos, alarmistas e mistificadores vibram, pois este terreno - progressivamente árido e doente - é fértil aos seus propósitos; mas, se devemos zelar pela alma, também precisamos zelar pelo corpo. Para tanto: Espírito e corpo, ser humano e Terra, o universo e Deus devem estar em comunhão e equilíbrio, perfeito e natural. E num organismo são, os tecidos tendem a se regenerar mais rapidamente!

Controlar a poluição ambiental; racionalizar, pesquisar e diversificar formas de produção sustentada de energia e alimentos; são necessidades reais e imediatas, muito mais prementes e indispensáveis que os lucros fáceis e abundantes dos mercados de supérfluos e conflitos bélicos forjados.

Talvez alguns digam que todo esse cuidado humano pode de nada adiantar, se um meteoro atingir nosso planeta; se um vulcão explodir em Yellowstone... Essas são outras hipóteses.

Pobre Gaia? Não! Se a Terra é um organismo vivo, nada a impede, como no poema de Drumond, de encontrar uma pedra no caminho; e qualquer volta ao pó - terrena ou cósmica - será o proverbial retorno do corpo à matéria, e do espírito à essência de Deus; mas que seja conscientes de que soubemos cuidar bem de seus templos, enquanto habitávamos neles.

Isso ocorrerá de uma forma ou de outra... Enquanto isso, o mínimo que podemos fazer por nossos descendentes e não negar-lhes um futuro!

Adilson Luiz Gonçalves

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