A POESIA DA PALETA DE PAUL KLEE

Sendo certo que foi um construtivista do abstraccionismo, um cubista pelo rigor das formas geométricas, um colorista de manchas difusas, não é menos certo que Paul Klee foi também um pintor de poesia visual.
Entre aguarelas e óleos que marcaram com a variedade das formas e das cores da subtileza, dos sinais e dos símbolos quase hieroglíficos, toda a arte ocidental das primeiras décadas do século XX, ao pintor suíço ainda restou tempo para honrar o latino Horácio e a arte poética deste, ao fazer poesia como pintura falada.
Fala-se sempre de Picasso que marcou o século passado porque concedeu à história universal da pintura um adjectivo e um significante (isto é ou isto parece um picasso), fala-se muito menos de Klee que deu no entanto à pintura as formas da cor, fazendo com que a luz deixasse de ser incolor e volátil, sendo curioso que foi na Tunísia e às portas do deserto que renovou conceitos sobre a luz.
Tudo isto vem a propósito da poesia de Paul Klee, não da poesia que habita uma boa parte dos seus quadros, mas da sua escrita poética propriamente dita.
Os Poemas de Paul Klee, em versão castelhana de 1995, numa edição de "La Rosa Cúbica", de Barcelona, escritos entre 1899 e 1933, porque o pintor achava que havia compatibilidades em ambos os trabalhos de criação, a poesia e as artes plásticas, produzindo assim intertextualidades ao nível estético, leituras paralelas, hierarquizando por vezes arte poética e arte pictórica.
Uma declaração do próprio pintor, quase nos leva porém a pensar que todo o seu trabalho pictórico foi condicionado pelo facto de ser sobretudo poeta. "No fundo sou poeta, mas o saber que o sou não deveria ser um obstáculo nas artes plásticas".
A poesia de Klee é poesia sem mais nada, quase minimalista, da ordem da filosofia antecipada do pós-moderno less is more. É ainda a poesia da sua pintura, sem concessões ao expressionismo germânico da época, sem perplexidades nem temas lancinantes, submetido apenas ao rigor da necessidade de se deslumbrar com a luz. E então essa luminosidade veio através da palavra poética.

Adquiri um fragmento de céu
Tu me tens dado a luz de novo na beleza.
Mas hei-de sofrer antes de iluminar.

A leitura de outro poema como o seguinte (Olhando uma Árvore), permite-nos que vejamos o tal despojamento, que se produza a tal intertextualidade, que fiquemos perante uma luminosidade de cores, formas e espaços, como se verifica em algumas das suas aguarelas mais conhecidas:

São invejados os pássaros
evitam
pensar no tronco e nas raízes
e satisfeitos se balançam, ágeis, o dia inteiro
e cantam nas pontas dos últimos ramos.

J. T. Parreira

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