Sushi-woman
Um dos livros que sempre estou lendo de novo é o romance “Shogun”, de James Clavell. Nele, somos levados a acompanhar a história de um marinheiro holandês, aprisionado pelos japoneses no Japão do século XVI. O livro todo é um belo estudo da cultura japonesa: o “bushido”, código de honra dos samurais; a arte do hai-cai; o pensamento e a forma de compreender o mundo desta cultura tão impressionante, curiosa e delicada. O processo de verdadeira “educação” pelo qual passa o prisioneiro, oriundo de uma Europa de hábitos grosseiros e pouco higiênicos é acompanhado pelo leitor ao longo do livro, e um dos aspectos mais interessantes é aquele que se refere à comida. Esta transição dietética do herói, que passa da sua alimentação habitual de carne vermelha, massas e ensopados grosseiros, pão e cerveja, para a delicada comida japonesa faz com que reflitamos muito sobre os nossos hábitos alimentares.
Hoje em dia, encontramos restaurantes japoneses a cada esquina e de certa forma é “cult” comer “sushi”, utilizando o “hashi”, ou seja, aqueles pauzinhos que se transformam em pinças eficientíssimas, quando adquirimos a prática. Sou adepta ferrenha desse tipo de culinária, que tem me ajudado ultimamente a não aumentar muito de peso, uma vez que a obesidade ou a ameaça dela tem sido minha companheira freqüente nesta meia-idade sedentária de muitas horas na frente do computador, ou lendo deitada na rede branca com varandas da mesma cor.
Coisa ruim na comida japonesa é comer sentada no chão, como é exigido em alguns restaurantes; e lembro-me de uma memorável tarde, em Recife, quando depois alguns sushis e uma garrafinha de saquê, fui me levantar e, ao ficar de pé, literalmente desmaiei, saindo do restaurante carregada. Saquê, nunca mais. Fiquei com medo da tal bebida com gosto de água estagnada e mortífera em relação ao meu equilíbrio e consciência.
Mas voltando à culinária japonesa, quero lhe dizer que gosto, saboreio com prazer, mas não sou uma expert. Não sei os nomes daquelas verdadeiras jóias construídas com atenção e minúcia pelos sushi-men, usando arroz, alga, e fragmentos de peixe, legumes, e outros ingredientes que não consigo identificar. Gosto de misturar o molho de soja com a raiz-forte e ali mergulhar o pequeno cilindro verde, prenunciando delícias gustativas. E é o tipo da comida delicada, visualmente estimulante, um pouco trabalhosa de comer, que exige sua atenção para o prato. Tudo isso estimula os mecanismos cerebrais de saciedade, fazendo com que simples trezentos gramas valham por uma macarronada inteira, ou uma feijoada completa, e que acabam por dar a sensação de plenitude alimentar exigida após uma boa refeição.
Uma das coisas que mais gosto é iniciar alguém nesses sabores, tendo já levado toda a minha família a esses restaurantes, e todos eles são adeptos e práticos no manejo do “hashi”. Agora, estou partindo para a fase dois, que é aprender eu mesma a preparar esta preciosidade na minha casa. Quando estiver dominando a técnica, quem sabe, caro leitor, se você não receberá um convite para almoçar?
Clotilde Tavares
Publicada em 29 de janeiro de 2006, na Tribuna do Norte, RN
Crônica enviada pela autora
« Volta