O SIGNIFICADO DAS ACADEMIAS DE LETRAS NO SÉCULO XXI

              Para que serve uma academia de letras?
              Creio que pelo menos a partir dos movimentos de vanguarda dos inícios do século XX as academias têm sido contestadas, combatidas, em casos extremos ridicularizadas. (Às vezes, é certo, por estarem verdes ...) Por outro lado, uma vaga em seu seio sempre foi e será objeto de desejo, oculto ou declarado, de um número ponderável de escritores de méritos e tendências os mais díspares.
              A polêmica, desde que instalada, tende a eternizar-se. E para tomar posição a respeito precisamos saber o que é, ou deve ser, uma academia:
              – Um agrupamento destinado a glorificar o nome e perpetuar a obra de um certo número –tradicionalmente quarenta– de escritores autodesignados como “imortais”?
              – Uma corporação de convivência cultural, às vezes nem tanto?
              – Uma base de trocas de elogios e, se a entidade for rica (o que é raríssimo), de benesses?
              Se a resposta fosse afirmativa para uma dessas perguntas, e se apenas isso, fôra compreensível e admissível, mas pouco para a importância que se dá ao instituto, e que transparece até na insistência das contestações.
              O art. 1.º dos brevíssimos Estatutos da Academia Brasileira de Letras, marco e modelo das inúmeras outras que vicejam em nosso país, atribui-lhe “por fim”, direta e singelamente, “a cultura da língua e da literatura nacional”.
              Língua e literatura – eis as palavras-chave. O Estatuto não o expressa, mas é curial que a cultura de uma e outra implique o cultivo da tradição; e nisso, que é seu apanágio, está o seu ponto vulnerável, aquele por onde a atacam os que manipulam os vocábulos conservadorismo e academicismo como armas de guerra. Na palavra tradição reside o busílis. Os adversários da instituição acadêmica acusam-na de tradicionalismo, no sentido pejorativo de conservantismo, de recusa ao experimento e ao novo.
              Se isso que nela se tem por pecha sói, opostamente, considerar-se base legítima de suas funções, o fiel da balança é a dosagem. A academia não é por definição, nem o deve ser mesmo, sistematicamente contrária ao novo. Nem é atribuição sua defender indiscriminadamente, isto é, sem critérios valorativos, tudo o que se abrigue sob o rótulo de tradição. Compete-lhe, isto sim, preservar das razias de vândalos e, já hoje, de pseudovanguardas irresponsáveis a integridade lingüística e o patrimônio literário nacionais.
              Até decênios atrás poder-se-ia admitir a hipótese de que essa preocupação fosse descabida ou exagerada; mas agora, dado o incremento e popularização das comunicações, da televisão e sobretudo da internet, a globalização enfim, temos de considerá-la importante e necessária. E eu diria que tanto basta para justificar a sobrevivência da instituição.

Anderson Braga Horta

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