A FALTA DE MEMÓRIA E IDENTIDADE
São muitas as dúvidas ao pensar na preservação da memória. As tentativas de projetos culturais nunca encararam a indústria cultural, tanto a produção quanto o consumo, a indústria do entretenimento produzindo distraídos e desconcentrados em série, fórmulas que regem as sociedades modernas. Estamos cansados de saber que os grandes conglomerados empresariais (o “lobby” das construtoras) junta-se à especulação imobiliária, são os agentes atuantes no mercado de consumo. Impossível, no começo do século 21, que a política cultural, tradicionalmente voltada para o patrimônio histórico, subvenções e subsídios à arte, não abranja os setores modernos da indústria cultural. Há muitos flancos expostos: o Estado sustenta a ciência e a tecnologia, e por que não discutir a Cultura versus a Educação? Aparentemente, um labirinto de estratégias (ou interesses) que parece superar as energias do aparato governamental local e chega até o nacional. Vivemos um momento de cartas na mesa, sem anteparos. Que podem resolver esses projetos, exemplo a lei do livro, de incentivos culturais e preservação da memória diante de milhões de analfabetos? Democratizar a cultura? Sem o domínio da língua padrão? Hoje, o analfabetismo, ou o semianalfabetismo, não se limita estar presente nos bancos escolares, pois, já atingiu fortemente o próprio corpo docente, em todos os seus níveis, do primário ao universitário.
E sem nenhuma dúvida chegamos ao pior: basta ver a matéria “Antigos periódicos se deterioram no museu”, publicada na edição de 14/09/2010 no caderno Cidades de O Imparcial de Presidente Prudente, São Paulo. A marca da violência no descaso, tanto da Cultura como de certos frequentadores do Museu e Arquivo Histórico Prefeito Antonio Sandoval Netto, um crime que destrói a história da imprensa local: a falta de respeito com os antigos diretores, jornalistas, fotógrafos, comentaristas, cronistas, revisores, paginadores e linotipistas, os anunciantes que mantinham seus funcionários e as publicações, que desdobraram para produzir um material de qualidade, nas mínimas condições de estrutura que a época oferecia. Aquele painel da vida, dos costumes e hábitos do século 20, se esfarela pela violência e falta de educação, cultura e pura violência pelo descaso do povo em geral. Some exemplares de A Voz do Povo, com altas doses críticas e polêmicas do Camel Farah, do Correio da Sorocabana, com artigos assinados por Pitolomeu, pseudônimo de Gabriel Octávio de Souza, de O Imparcial, onde trabalhou muita gente competente, a exemplo de Montezuma Cruz, Manuel de Freitas, a enciclopédia do futebol, Folha Prudentina, Diário de Presidente Prudente, com o time de Luis Roberto da Cruz, Valderi dos Santos, Luiz Alberto Pereira, Antonio Carlos Magdalena, Irani de Souza, Joaquim Nascimento, o setor policial com Daniel Macedo, a paginação de José Onofre (o Bruno), Antonio Carlos Matos e a impressão de Antonio Marcelino, Ézio Avelar e Josias Pereira dos Santos. Mais recentemente, Jornal do Comércio, a geração 80 da comunicação escrita: Roberto Prioste, Maria Bernardete Toneto, Luís Augusto Pires Batista, Paulo Trevisani Júnior, Luiz Fernando Ávila, Frank Rogério Fonseca Martins, as charges do Zeca e o colunismo social de José Vanir Daniel, Folha da Região, a Região, perfis de políticos elaborados por Álvaro Gomes, a revista O Momento, produzida por Rubens Shirassu, Sérgio Antonio, Altino Correia, Adelmo Vanalli entre outros profissionais e colaboradores. Esta é apenas uma fotografia 3x4 do que vem ocorrendo com os museus e a memória de quase todo o Brasil. O que vai ser das novas gerações do jornalismo quase sem material para estudo e pesquisa, no que se refere à linguagem, ficarão sem referências.
É possível, sim, uma parceria entre a Prefeitura e empresas particulares que, sem dúvida, podem recorrer às leis de incentivos fiscais. Quero deixar claro o jogo desta discussão: qualquer estratégia cultural terá de ser concebida frontalmente contra tal estado letárgico de coisas. Sem romper com essa realidade, incide-se num plano hipócrita e boçal.
Outra prioridade inadiável, é questão sobre a política de educação, da desburocratização da máquina emperrada do Estado. Um problema que corre junto com a escolaridade, profissionalização, o incentivo à geração de empregos e valorização dos bens públicos e culturais, entre outros. Se somos um País rico e grande é preciso que a tecnologia digital sirva para otimizar a formação do acervo de periódicos (revistas e jornais) dos museus local e regionais. Que a grande rede da internet sirva para divulgar esses bens culturais e não fique toda vida atrelado às redes de interesses políticos, por demais elitistas. Saindo do vício da “politicagem'. A preocupação básica, depois do equilíbrio financeiro, educação, saúde e moradia, é abandonar os chavões e estratagemas, principalmente, o jogo de armar espetáculos cheios de recursos visuais, contando no elenco de estrelas globais, promovendo para obter um bom retorno financeiro, portanto, deve-se enfrentar, de forma bem sensata, os desafios da sociedade urbana e industrial, a era do vídeo e da informática. Sem paternalismo, que se dê ao brasileiro, aos bons servidores da cultura, além dos museus de todo o País, condições mínimas de sobrevivência, dignidade e de integração a essa modernidade.
A história de um povo, suas raízes, ou, seus costumes, é feita através de iniciativas culturais que preservem o seu passado para poder contar a gerações futuras. Há algum tempo, aconteceu a demolição do antigo hospital psiquiátrico, em seguida transformado em “Hotel Municipal”, localizado na rua Joaquim Nabuco, esquina com a Dr. Gurgel, que descaracterizou o aspecto físico do patrimônio histórico e apenas está guardado na memória dos prudentinos, de 39 anos para cima, de ex-funcionários, antigos viajantes, frequentadores do local, além de pessoas conscientes e preocupadas com a questão, pois, sem documentos concretos Presidente Prudente se tornará uma cidade vazia, sem referencial, sem identidade e perdida no espaço.
Rubens Shirassu Jr.