É para o seu bem

Quando filhos, filhas, genros e noras de um velho lhe querem impor suas vontades, alegam: ”É para seu bem”. Porque eles são sábios, só eles sabem o que convem, atualmente, aos que os puseram no mundo. Ai cabe a pergunta: "Como é que eles sabem o que é para o bem dos anciãos a quem negam o direito de duvidar?" Também me indago se estes pais que os sustentaram, oa alimentaram, os educaram, os formaram, de repente, não mais que de repente, se eles não se tornaram inválidos mentalmente, se não perderam o norte, a orientação e a competência que tinham. E por conta de tal perda, precisam de tutores.
Para mim, a maioria da origem de tal zelo se deve ao receio que acomete aos herdeiros de que os velhos venham a lhes dar trabalho. Poupam-se deste temor, amputando suas vidas ou a vontade de viver a vida, como lhes apraz. Como se vê esta tutela é pesada para suas vitimas, dadas como beneficiários.
Para mim todos deviam ter o direito de viver e morrer como lhes agrada, faz bem, dá prazer. Não o que faz bem ou proporciona prazer (ou comodidade) aos filhos, genros, noras, netos e aderentes.
Claro que, em futuro próximo, o problema da tutela dos velhos pais será inexoravelmente resolvido pelos asilos a que serão recolhidos. Não venham a fingir espanto, mostrar horror diante do que farao inevitavelmente seus herdeiros. Por isso ninguém pasme diante da previsão de que seu pai e seu avo irão merecer cuidados profissionais de estranhos, quando mais velhos estiveram. Porque ninguém vai ter tempo para cuidar de velho, em casa. Não adianta o espanto, às vezes empostado, de hoje. O que vai valer será a realidade do momento, do amanhã.
A família mudou muito depois da revolução dos costumes de 1968 e principalmente depois que as mulheres passaram a trabalhar pelo sustento pessoal e da família e também a usufruir o direito de sair sozinhas para se divertir, seja qual for sua idade. Assim não ficam mais em casa, cuidando dos netos da filha desquitada ou viúva quando elas têm que passear, comparecer a festas, frequentar as boates. Acabou a estória de avós escravas temporárias de netos. Bem como findou a tradição de uma filha renunciar à própria vida, ao sexo, ao casamento, para ficar cuidando dos pais. Isto não existe mais e a saída é o caminho do asilo, de maior ou menor conforto, conforme as possibilidades financeiras de cada um.
A propósito, acho muito generoso projeto de lei acabam com a reclusão, a prisão dos doidos. Através dele, os doentes mentais viverão em casa, com suas famílias e não mais isolados em asilos de saúde mental. Acho humanitária tal intenção e digna de aplauso. Porém... Os ricos podem pagar duas, três enfermeiras para cuidar do enfermo. Mas e os pobres, como viverão com tais parentes entre as quatro paredes apertadas do cubículo em que se escondem? Como poderão conviver com seus doidos quando foram trabalhar? E se trabalham a noite, quem vai cuidar deles? Na prática, só os asilos...

Lustosa da Costa

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