UMA COUVE-FLOR
Uma couve-flor, o que é? O que pode ser?
Como pode ser uma couve, dentro de uma travessa ou prato cotidiano, para alimentar o homem, com a sua fome rara?
Uma couve-flor, o que é, o que pode ser?
Como pode ser uma flor num canteiro do jardim ou num vaso da varanda ou na jarra a adornar a ceia, sobre a mesa da sala?
Uma couve-flor não será um fungo, um cogumelo, um champion que se degenerou? Ou será alguma flor maricas que vem afeminar a comida do homem?
A couve-flor será, talvez, uma bomba camuflada, cuja semente caiu do céu azul — fruto de seus diabólicos poderes — e germinou na terra fazendo crescer a planta, multiplicando o tronco, ramas e talos somente para incendiar cidades, destruir povoações inteiras como as tranqüilas gentes orientais, esses tão educados habitantes de Hiroshima e Nagasaki, que não morreram num terremoto, nem de inanição, nem de velhice, nem de doença (nem de haraquiri) porque a sua morte chegou sob a forma e a ação de...
um cogumelo
um fungo
uma couve
uma flor
alimentada pelo pior ódio existente no universo: o humano!
Bomba terrível, flor ou couve, couve ou flor, couve dos céus, diabólica flor dos infernos, sobre a nossa Terra.
Gosto de devorá-la, com ganas, como se fosse uma couve. Mas me encho de ódio ao olhá-la assim, com essa forma de fungo, de flor degenerada, de uma bomba atômica...
Dilermando Rocha
Do livro: "Jardim esquisito", Achiamé, 2001, RJ
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