GIZ PRETO EM QUADRO NEGRO

            Depois que você criou a distância, tudo para mim tem sido tão nada...Não surge nem espaço nem tempo, nem fuga nem encontro, nem sorriso aberto, nem olhos marejados, somente, às vezes, olhos cristalizados de ponto vazio fixo.
            A luz revive provinda da fé. Seus beijos não os esqueço sempre, mas os confundo em todo meu meio viver, meio sonambular. Sua voz não escuto com fidelidade de nitidez, é apenas um reboar de sino empoeirado.
            Depois que você criou a distância, embalada pela recíproca acumulada do amor e eu admiti, um amor ofertado, prometido e não realizado; ah! aí então todos os escritos cessaram, as cores fundiram-se parcas e eu me perdi sobre tudo,  perdi sobretudo o mais valioso e dignificante: o meu querer.
            Nem a idéia permaneceu abstrata, encontrou na constância o seu concretismo. Encontrou na fixidez a sua forma, uma forma robusta e porosa. Há um poema seu escondido em papel, há um outro solto, pululante dentro de mim e ainda, plena certeza tenho, um outro poema rosa, só que este meu, esmaecido dentro de você.
            Por você ter criado a distância, o mais para mim tem sido menos, dou cansativas voltas em torno de mim mesmo à minha procura, não avisto nem o eu antigo. Não há o desencontro da poesia, porque barbaramente ela não mais se anunciou, nem mesmo para desencantos e desencontros e desenganos.
            Em nosso tropical tempo, anterior à criação da distância, houve poesia de espera (flores na mão), poesia de encontro (beijo úmido), poesia de procura (meia de nylon com furinho  à altura da coxa). No entanto,  hoje há somente a sentida ausência do perfume, do batom, do reloginho mimoso.
            Hoje a afirmação se faz necessária, mas a necessidade não afirma o que pretendo e nem sou mais, com afirmação categórica, o que continuo sendo. Como que se tudo que afirmo esteja sendo transcrito em um enorme quadro negro, com giz preto, nada se destaca nem para mim, nem para ninguém!
            Depois que você criou a distância, minha estória de amor ficou igual (e a frase seguinte leva o cansaço das repetições enfadonhas) a todas outras estórias de amor... Alguém chegou, alguém partiu e não era carnaval. Amei como personagem de um romance que eu mesmo fui o escritor, reli o romance, desconheci o personagem e grotescamente esqueci o nome e a vida do autor.
            Depois que você criou a distância, as palavras que eu costumava pronunciar, não mais ricocheteiam em ouvidos qualquer e as chuvas de papéis prateados que cintilavam meus poemas, aderiram a um frio inconformismo. Seus beijos não os esqueço sempre, mas os confundo em todo meu viver.

       Depois que você criou a distância e eu assenti, ah! aí então, não admitimos tudo, rodei preenchendo o nada de nadas, de minha silhueta nasceu um andrajoso andejo, de meu semblante abatido um vulto disforme. Depois que, desavisadamente, eu aceitei a enorme distância que você criou..., fiz da insônia o
meu dormir.
Jocimar
 
 

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