Percorri em silêncio
o nosso caminho. Só pensei em ti. Em nós também, mas
agridem-me as lembranças de um tempo que há muito deixei
de viver. Em nós, pensei menos um bocadinho. Lembrei-me de como
as árvores no horizonte se transformavam por magia em guerreiros
gigantes, guardiões da passagem mais nobre para os montes distantes,
mesmo na fronteira do paraíso, quando ainda bricavamos ali. E afinal
o paraíso eras tu, bem o sei agora.
Escapa-se das minhas mãos
a água do riacho, como por entre os dedos fugiu a última
madeixa do teu lindo cabelo negro que tive a sorte de acariciar. O cabelo
longo que molhavas com alegria, junto à agua que corria. E eu, encostado
a uma rocha, olhava para ti e ficava feliz.
Na boca amarga-me amor o
acre da saudade, mastigada com solidão. A água fresca do
riacho não me adoça o coração azedo e não
mata a sede, a que mais me atormenta, muita sede de ti.
Mas bebo muita, bebo toda
quanto posso, que quando o teu sorriso se fez beijo, chapinhavamos os dois,
a água já aqui corria. Se for a mesma, aquela mesma que te
tocava, prometo todos os dias aqui virei, em silêncio pelo caminho,
dar à alma a tua boca e à minha boca uma ilusão.
Jorge Gomes da Silva