Enigmática

As lágrimas escondiam-se em seus olhos. Depois de um curto silêncio, deitou-se em seus próprios ombros, como sempre fazia. Os lábios retesados buscavam palavras que pareciam estrangeiras em sua própria boca. Dentro dela, caminhavam emoções que não conseguia alcançar. Havia sempre um pulsar desenfreado de sentimentos a lhe interrogar.
Mirou-se mais uma vez, e o espelho refletia detalhes enigmáticos. Queria tomar-se nos braços. Talvez, assim, tão próxima de si, pudesse entender a estranheza desconhecida que dela emanava.
Sob o céu da noite, a dor parecia luzir mais que qualquer outra estrela. Os dedos desenhavam um tic-tac pausado e preguiçoso, entreolhando-se furtivamente, enquanto o tempo deixava-se abandonar no abraço dos ponteiros.
Tentava não pensar em nada, mas as perguntas vibravam em sua respiração. Estavam coladas à sua pele, estremecendo como arrepios. Desejava o que não conhecia, e muitas vezes indagava-se, se o que buscava existia. Havia um eco de curiosidade a habitar em seus ouvidos. Notas inacabadas a vagar na perplexidade de uma melodia que não podia precisar, se um dia seria executada.
Moveu-se lentamente, tentando surpreender-se. Mesmo despida, as mãos não conseguiam tocá-la, pois ela parecia estar sempre além de si. Andava, alma solta, pés a flutuarem, como a provarem estrelas. Fragmentava-se e mergulhava em suas fontes, afogando-se na inconsciência. Tudo dentro de si era tão profundo que o próprio silêncio desamparava-se em inquietação.
Às vezes, perguntava-se, porque tinha que sentir tanto. Uma vertigem a tomou, como se por instantes, a vida a sugasse. Assustava-se com esta naturalidade com que se multiplicava, para encontrar-se com a solidão.

Fernanda Guimarães


 

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