Penúria

A areia escaldante queimava os pés calejados, escaldados...
O suor escorria na face lânguida, faminta, sofrida...
Os últimos raios do sol deixavam rastros serpentes; labaredas de fogo do calor possante, constante, no horizonte a perder de vista...
As vistas já sem visão, banhadas de ilusão, visionavam miragens, paragens, oásis de terras produtivas...
Desatino do destino?
No passado, deixado, a lembrança da fartura, do leito corrente, da água cristalina a encher a tina vazia, da mesa farta... Que falta!
Dura realidade esta de agora. Outrora, negara o fardo da vida. Que ressequida, nada valia...
Só lhe restavam quinquilharias de dias, que escorriam em vaias de fracasso, fiasco... Asco, da terra fértil que se deixou morrer; da água vertente, que doente, banhou-se de lodo, engodo avarento, nojento, que só trouxe tormento; da tormenta de vento que desabou o teto, assassinando o feto que no ventre, latente, não vingou.
Vingança?
Os credos e as cruzes, sem luzes coroadas de esperanças, sem crianças, encontravam-se ensacoladas, esquecidas na carga pesada, que vergava as costelas, magrelas, daquela que um dia, queria, parir a vida...
No cansaço do momento, a fala, que cala, na boca ressequida, dorida, atiça as escórias da memória... E, delira, com ira, no impávido desejo de inverter a realidade:

—  Água, só sede, sem fé, só... sol vá! Vá sol... só fé, sem sede, só água!

Angela Bretas

« Voltar