Os olhos do deserto foram furados pela lança do cowboy de Édipo, pelo falo de um deus camelô, cheirado e embriagado, a vender armamentos de guerra e ações de petróleo pela TV . Vai levar, freguês? APROVEITA QUE É HOJE SÓ! Mísseis a preço de ocasião. Compra um e leva de brinde um canhão!
Os olhos do deserto se esconderam aterrados em buracos.
Olhos à procura da Mãe . Querem voltar pra casa. Querem o
khol, o carmim e a vulva. Querem a brisa morna das noites dos jardins da
Babilônia, o calor dos seios da amada Ishtar. Exaustos, acuados,
torturados, órfãos de Nabucodonosor, os olhos não
querem mais o sangue viscoso do negror das florestas petrificadas em óleo.
Os olhos do deserto não querem fumaça
a cegar os olhos das mesquitas, nem morte a gelar a carne das suas meninas.
Querem olhar outra vez o sêmen do pênis do Eufrates a engravidar
as tamareiras. Querem as fitas, os rodopios, os véus e as verduras
e frutas das mulheres do mercado. Querem de volta o cio e a ternura do
sândalo e das especiarias. Querem recontar estrelas e reinventar
uma nova matemática.
Os olhos do deserto não querem mirar a imagem
dos seus filhos mutilados em fotografias. Ao deserto basta somente
mirar a Lua e parir caminhos nas estrelas...