A FLOR DO CACTO
O homem tinha a roupa sórdida, faces fundas mosqueadas de barba e o cheiro acre de ruas antes da chuva.
A penúria e a dor eram suas algemas, mas sorria, entre o frio de coisas possuídas por outrem.
Eu não conseguia entendê-lo, pois meus dedos tinham anéis e o mundo me parecia um pomar de tédio.
Hoje, carente, também sorrio: a leve contração de meus músculos faciais atenua o verde fel que me oprime as veias.
Neste momento, constrangido, sou irmão do mísero e das ervas que crescem, obscuras, sob as escadas.
Cláudio Feldman
Do livro: Vila magra, Editora Taturana, 2006, SP