Caminhada
Era de noite. Voltava para onde nasci. Saíra o Sol se pondo, mas era longe e o caminho íngreme, com subidas e descidas. Aos poucos o olhar foi se acostumando e, em meio à clareira da escuridão, caminhava solitário dentro de mim. Ao chegar ao alto de um monte, bela, prateada, noiva noturna, a Lua surgia no horizonte da noite originária. O caminho se prateou e, de repente, a solidão se tornou estranha. Parecia que alguém me acompanhava. Talvez o estranho da Noite suscitasse em mim esse desconforto. Olhei para um lado e para outro. E nada. Calmo, pois conhecia o caminho e o lugar de onde viera e para onde ia, prossegui, até que de repente me surpreendi e compreendi, dando-me vontade de rir: era minha sombra. Solitário, na Noite abismal, me perguntei quem, afinal, era: eu ou a sombra? Eu era e a sombra era. Eu era dois? Não. Minha sombra, no parecer, mostrava o ser que, se dando no que parecia e era, se retraía e resguardava. O caminho também era e também era a escuridão. E a luz da Lua era. Tudo se dando na clareira. Ah, a própria clareira era. Se tudo era, o próprio Ser era. No âmbito da clareira tudo era, porque nela se dava o Ser. Eu voltava para onde nasci. E agora procurava o Ser. Na clareira que agora se abria em mim, o Ser era Nada do que era. Ao se dar na clareira e no que na clareira é, Ele se retraía e velava. Não adiantava perscrutá-lo que na clareira não se mostrava, nem naquela em que eu caminhava nem na que eu percorria na minha solidão. Mas o ser se dava em cada ente.
Isso me bastava. Que mais queria? Eu era. Ser não é o bastante para todo querer. E tudo à minha volta era. O ser não me esperava nem eu esperava mais o ser. Ausente, mas era em cada ente. De tão próximo só me restava acolhê-lo. E chegar aonde nasci. Com confiança e serenidade.
Manuel Antônio de Castro