Pra começo de conversa...
Estou vivo. Não sou desses por aí que andam, copo na mão, desfolhando árvores secas com seus discursos falidos. Eu estou vivo, sou vivo, sangue corre nos vasos. Posso até doar minha vida a quem precisa. Você precisa? Doo vida, doo sangue. Só não vou doar minha alma. Minha alma é transparente, feito um rio nascente, cheia de nuances e cristalinos desvios. Não sou perfeito, longe de mim, porém quem me conhece sabe de minha generosa vastidão. Corro rápid o, por entre as frestas de luz das venezianas, sou o primeiro que aparece, meu fluido está em todas as coisas, eu sou da paz e da luz. Não me venha você dizer coisas vãs e inúteis, coisas como " hoje, acordei estranho, niilista" ou "na espera de um futuro, matei meu presente...". Eu bato de volta, toma lá, dá cá. Posso até oferecer as duas faces, mas nenhuma delas gosta dessa desfaçatez toda, desse amargor ruminante, dessa ruína corporal que é o tédio. Longe de mim! Tédio, prédio, ódio, ruas cheias de máscaras, abismo cultural, eu não sou fã de ameaças. Não pretendo seguir em proselitismos, sigo tentando o melhor. Não sou Dante a procurar Beatriz, nesse Vale de Lágrimas. Quem achar me conte onde está, estou em outra. Estou na onda da cor suave, estou andando em nave solta, de poucos marulhos; todas as águas que vêm são as melhores. O que me convém. Sem ser ególatra. Nem egoísta. Aceita um copo cheio de manhãs?
Flavio Gimenez