O CATA-VENTO

        Eu me escondia atrás das persinas. E o dia se fechava os olhos como as jovens suicidas em seus leitos de mormaço. Nos meus sonhos as pedrad imperturbáveis feriam os dedos de quem tentasse tocá-las. E eu circulava entre a duna e o mar, no espaço não atingido pelo bolor da vida.

        Menino, eu caminhava ao lado de minha eternidade e de sua ferida gotejava a morte. Na minha cidade natal, entre homens vestidos de branco e cães cegos e leprosos que acompanhavam docemente os mendigos, o mar me interrogava. E eu soletrava o dia que rangia como um cata-vento.

Lêdo Ivo

Do livro: "Poesia Completa - 1940-2004", Topbooks, Estudo introd. Ivan Junqueira, Topbooks, RJ, 2004

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