BOAL - In Memoriam
Estava na sala, ligo o compoutador e a notícia do falecimento de Augusto Boal, me atinge. Não o conheci pessoalmente, mas o admirava e trabalhei muito seus exercícios, com grupos de mulheres e adolescentes, pessoalemmnte.Havia sempre um efeito de alívio pós catarse quando tudo terminava Eu fazia um relax e as pessoas sentiam-se em paz e mais conhecedoras de seu self. Gestalts eram fechadas, indagações brotavam. Mais tarde, abro o PC e encontro um sentido e-mail de Teresinka Pereira, brasileira e Presidente da IWA, residente nos Estados Unidos:
"Faleceu Augusto Boal, o criador do "teatro do oprimido", o diretor que queria transformar a realidade a partir do teatro. Aos 77 anos, de leucemia. Eu estou com muita pena. Fui amiga do Boal, trabalhei com ele na California. Até fizemos uma viagem juntos. Estou muito chateada com a morte dele.
TERESINKA PEREIRA"
Respondo-lhe:
Sim , amiga, as pessoas se vão e fica-nos a saudade.jamais o conheci pessoalemnte, mas ele esteve presente em minhas dinãmicas de grupo, quando trabalhava com minorias, adoelscentes, mulheres.Seu livro sobre 100 exercícios de laboratório teatral, com fotografias dos métodos, passava de mão em mão e o guardo com carinho.
Hoje, liguei a Tv e soube, ainda não lera jornais. Foi um susto, vou preparar um memorial para e mandarei a página para você , se vc sentir vontade de escrever, será um prazer postar. O Teatro do optimido marcou época e agora é eterno.
Um abraço, meus sentimentos por vc ser sua amiga.
Agora à noite, encontro seu poema, para o amigo:
AUGUSTO BOAL
(1932-2009)
Naqueles anos
de exilio
nao qualificado
de "tortura"
encenavamos
o absurdo da vida
em um festival de teatro
na Califórnia.
O absurdo nos fazia
denunciar
a ditadura militar
sem aceitá-la.
Hoje me entregas
uma quota de absurdo
que nao me permite
negá-lo: tua morte.
Sentiremos tua falta,
companheiro Boal,
para sempre.
TERESINKA PEREIRA
3 DE MAIO, 2009.
A foto acima ilustra o texto dele, abaixo, no Dia Internacuonal do Teatro (27 de março, no mês passado):
Dia Mundial de Teatro
27 Março, 2009
Augusto Boal
Todas as sociedades humanas são espetaculares no seu cotidiano, e produzem espetáculos em momentos especiais. São espetaculares como forma de organização social, e produzem espetáculos como este que vocês vieram ver.
Mesmo quando inconscientes, as relações humanas são estruturadas em forma teatral: o uso do espaço, a linguagem do corpo, a escolha das palavras e a modulação das vozes, o confronto de idéias e paixões, tudo que fazemos no palco fazemos sempre em nossas vidas: nós somos teatro!
Não só casamentos e funerais são espetáculos, mas também os rituais cotidianos que, por sua familiaridade, não nos chegam à consciência. Não só pompas, mas também o café da manhã e os bons-dias, tímidos namoros e grandes conflitos passionais, uma sessão do Senado ou uma reunião diplomática – tudo é teatro.
Uma das principais funções da nossa arte é tornar conscientes esses espetáculos da vida diária onde os atores são os próprios espectadores, o palco é a platéia e a platéia, palco. Somos todos artistas: fazendo teatro, aprendemos a ver aquilo que nos salta aos olhos, mas que somos incapazes de ver tão habituados estamos apenas a olhar. O que nos é familiar torna-se invisível: fazer teatro, ao contrário, ilumina o palco da nossa vida cotidiana.
Em Setembro do ano passado fomos surpreendidos por uma revelação teatral: nós, que pensávamos viver em um mundo seguro apesar das guerras, genocídios, hecatombes e torturas que aconteciam, sim, mas longe de nós em países distantes e selvagens, nós vivíamos seguros com nosso dinheiro guardado em um banco respeitável ou nas mãos de um honesto corretor da Bolsa - nós fomos informados de que esse dinheiro não existia, era virtual, feia ficção de alguns economistas que não eram ficção, nem eram seguros, nem respeitáveis. Tudo não passava de mau teatro com triste enredo, onde poucos ganhavam muito e muitos perdiam tudo. Políticos dos países ricos fecharam-se em reuniões secretas e de lá saíram com soluções mágicas. Nós, vítimas de suas decisões, continuamos espectadores sentados na última fila das galerias.
Vinte anos atrás, eu dirigi Fedra de Racine, no Rio de Janeiro. O cenário era pobre; no chão, peles de vaca; em volta, bambus. Antes de começar o espetáculo, eu dizia aos meus atores: - “Agora acabou a ficção que fazemos no dia-a-dia. Quando cruzarem esses bambus, lá no palco, nenhum de vocês tem o direito de mentir. Teatro é a Verdade Escondida”.
Vendo o mundo além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida.
Assistam ao espetáculo que vai começar; depois, em suas casas com seus amigos, façam suas peças vocês mesmos e vejam o que jamais puderam ver: aquilo que salta aos olhos. Teatro não pode ser apenas um evento - é forma de vida!
Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!
- Augusto Boal
Boal's 2009 Address:
All human societies are “spectacular*” in their daily life and produce “spectacles” at special moments. They are “spectacular” as a form of social organization and produce “spectacles” like the one you have come to see.
Even if one is unaware of it, human relationships are structured in a theatrical way. The use of space, body language, choice of words and voice modulation, the confrontation of ideas and passions, everything that we demonstrate on the stage, we live in our lives. We are theatre!
Weddings and funerals are “spectacles”, but so, also, are daily rituals so familiar that we are not conscious of this. Occasions of pomp and circumstance, but also the morning coffee, the exchanged good-mornings, timid love and storms of passion, a senate session or a diplomatic meeting - all is theatre.
One of the main functions of our art is to make people sensitive to the “spectacles” of daily life in which the actors are their own spectators, performances in which the stage and the stalls coincide. We are all artists. By doing theatre, we learn to see what is obvious but what we usually can't see because we are only used to looking at it. What is familiar to us becomes unseen: doing theatre throws light on the stage of daily life.
Last September, we were surprised by a theatrical revelation: we, who thought that we were living in a safe world, despite wars, genocide, slaughter and torture which certainly exist, but far from us in remote and wild places. We, who were living in security with our money invested in some respectable bank or in some honest trader's hands in the stock exchange were told that this money did not exist, that it was virtual, a fictitious invention by some economists who were not fictitious at all and neither reliable nor respectable. Everything was just bad theatre, a dark plot in which a few people won a lot and many people lost all. Some politicians from rich countries held secret meetings in which they found some magic solutions. And we, the victims of their decisions, have remained spectators in the last row of the balcony.
Twenty years ago, I staged Racine's Phèdre in Rio de Janeiro. The stage setting was poor: cow skins on the ground, bamboos around. Before each presentation, I used to say to my actors: “The fiction we created day by day is over. When you cross those bamboos, none of you will have the right to lie. Theatre is the Hidden Truth”.
When we look beyond appearances, we see oppressors and oppressed people, in all societies, ethnic groups, genders, social classes and casts; we see an unfair and cruel world. We have to create another world because we know it is possible. But it is up to us to build this other world with our hands and by acting on the stage and in our own life.
Participate in the “spectacle” which is about to begin and once you are back home, with your friends act your own plays and look at what you were never able to see: that which is obvious. Theatre is not just an event; it is a way of life!
We are all actors: being a citizen is not living in society, it is changing it.
- Augusto Boal
Journée Mondiale du Théâtre – Message international
27 mars 2009
Augusto Boal
"Toutes les sociétés humaines sont spectaculaires dans leur quotidien et produisent des spectacles pour des occasions particulières. Elles sont spectaculaires en tant que mode d'organisation sociale, et produisent des spectacles comme celui que vous êtes venus voir.
Même si nous n'en avons pas conscience, les relations humaines sont structurées de façon théâtrale: l'utilisation de l'espace, le langage du corps, le choix des mots et la modulation de la voix, la confrontation des idées et des passions, tout ce que nous faisons sur les planches, nous le faisons dans notre vie : nous sommes le Théâtre !
Non seulement les noces et les funérailles sont des spectacles, mais le sont aussi les rituels quotidiens si familiers qu'ils n'affleurent pas à notre conscience. Non seulement les grandes pompes, mais aussi le café du matin et les bonjours échangés, les amours timides et les grands conflits passionnels, une séance du sénat ou une réunion diplomatique- tout est théâtre.
L'une des principales fonctions de notre art est de porter à notre conscience les spectacles de la vie quotidienne dont les acteurs sont également les spectateurs, dont la scène et le parterre se confondent. Nous sommes tous des artistes: en faisant du théâtre, nous apprenons à voir ce qui nous saute aux yeux, mais que nous sommes incapables de voir tant nous sommes seulement habitués à regarder. Ce qui nous est familier nous devient invisible: faire du théâtre, c'est éclairer la scène de notre vie quotidienne.
Au mois de septembre dernier, nous avons été surpris par une révélation théâtrale: nous qui pensions vivre dans un monde sûr, malgré les guerres, les génocides, les hécatombes et les tortures qui, certes, se déroulaient mais loin de nous dans des contrées lointaines et sauvages, nous qui vivions en sécurité avec notre argent placé dans une banque respectable ou dans les mains d'un honnête courtier en bourse, on nous a dit que cet argent n'existait pas, qu'il était virtuel, fiction de mauvais goût de quelques économistes qui eux n'étaient pas fictifs, ni sûrs, ni respectables. Tout cela n'était que du mauvais théâtre, une sombre intrigue dans laquelle quelques-uns gagnaient beaucoup et où beaucoup perdaient tout. Des politiciens des pays riches ont tenu des réunions secrètes d'où ils sont sortis avec des solutions magiques. Nous, victimes de leurs décisions, nous sommes restés spectateurs assis au dernier rang du balcon.
Il y a vingt ans, je montais Phèdre de Racine à Rio de Janeiro. Les décors étaient pauvres: des peaux de vache au sol, des bambous autour. Avant chaque représentation, je disais à mes acteurs: "la fiction que nous avons créée au jour le jour est finie. Quand vous aurez franchi ces bambous, aucun de vous n'aura le droit de mentir. Le Théâtre, c'est la Vérité Cachée".
Quand nous regardons au-delà des apparences, nous voyons des oppresseurs et des opprimés, dans toutes les sociétés, les ethnies, les sexes, les classes et les castes; nous voyons un monde injuste et cruel. Nous devons inventer un autre monde parce que nous savons qu'un autre monde est possible. Mais il nous appartient de le construire de nos mains en entrant en scène, sur les planches et dans notre vie.
Venez assister au spectacle qui va commencer; de retour chez vous, avec vos amis, jouez vos propres pièces et voyez ce que vous n'avez jamais pu voir : ce qui saute aux yeux. Le théâtre n'est pas seulement un événement, c'est un mode de vie!
Nous sommes tous des acteurs : être citoyen, ce n'est pas vivre en société, c'est la changer."
- Augusto Boal
E brota-me o poema, em sua memória:
O abridor das portas de gaiolas
Clevane Pessoa - 03/05/2009
Uma bola no sobrenome, a terra, o planeta interior,
o mundo dos artistas: "atores somos todos nós",
decreta BOAL, no dia do Teatro Boal.
Percebe a caixas de sufocamento no peito das pessoas
e quer abri-las, num rasgo de coragem.
Cria oTeatro do OPRIMIDO
cirurgião de gaiolas, arranga os nódulos,
as metástades da opressão
e o ar ganha passagem,
e Liberdade canta e as pessoas
se sentem livres.
Brincam de angústia e se livram dos medos.
ese libertador, não morrerá jamais.
Uma taça de vinho a esse Homem
unipresente em tantas almas e espaços.Clevane Pessoa de Araújo Lopes