TERRA, PLANETA VIDA...

Havia um planeta, em certos confins do infinito, que se chamava terra. Era um planeta que respirava, que gerava, que cosmologicamente pensava, que sentia, que vivia. Era um planeta-vida. Ele mesmo a própria vida. Azul de vida. Por algum mistério insondável, algum segredo de poética e divina inspiração, terra engendrava uma profusão infinita de vidas. Terra era a criadora, era a criatividade, era a arte da arte, era a poesia de vital vida. Terra era a vida que, dos poros, fazia nascer vidas.

Cada vida que surgia e se alimentava da terra era, como toda vida, uma maneira única de ser vida; uma maneira única de estar no mundo, de estar na terra. Cada vida tinha sua consciência própria, tinha sua própria racionalidade, tinha uma organização própria, um modo de saber viver próprio.

Entretanto, terra engendrou o homem. O homem poderia ser o grande ponto de equilíbrio, o grande colaborador da vida ; poderia ser aquele ser que zelaria pela sua vida , zelando pelas vidas, pela terra. Mas o homem achava que ele era o ser mais complexo, mais inteligente. Nas escolas ( um casa de insanidade, dentre outras, criada para enquadrar e enlouquecer pessoas) se inculcava nas crianças ( filhotes do ser-homem) a mentira cafajeste de que o homem era o único ser racional do planeta e de que os outros seres eram irracionais.

O homem também construiu uma história de guerras, de massacres de outros homens, de massacres de tudo que era diferente do racional ser-homem. O homem chamava o seu desrespeito pela vida de progresso, de desenvolvimento. O homem chamava o seu modo de pensar em destruir a vida de ciência. Ciência era o nome que o homem deu ao seu conhecimento de destruição da vida. O homem destruía florestas, matava animais, poluía o ar e os rios. O homem escravizava outros homens.

Mais ou menos pelos idos de 2005, - essa era uma data que tem o seu início com a morte de Cristo. Cristo era um homem que morreu porque não sofria do mal do espelho, porque era a favor da vida e por isso mesmo os homens O mataram: e mataram Deus.E porque o homem era muito hipócrita, a morte de Cristo se transformou no marco da era da destruição, na era do branco, europeu, racional, adulto, macho, moralista, científico, lucrativo, apropriativo, tecnológico, primitivo, etc.

Pelos idos de 2005, dois de cada três seres humanos estavam na mais absoluta miséria, enquanto que o um que sobrava sofria do mal do espelho, sofria de miséria da alma, de compulsão desenfreada em querer ter, ter, ter,ter... Como uma criança mimada. Pelos idos de 2005, numa época em que cada homem racional, apropriativo, tecnológico, primitivo matava de fome dois outros seres humanos, ainda existia o professor ( professor era um ser humano que vivia reclamando de baixos salários e cuja função consistia em emburrecer os filhotes dos seres humanos a pretexto de os estarem tornando mais inteligentes) que pretensiosamente achava que ensinava os alunos ( alunos eram crianças/adolescentes que a escola tinha a função de disciplinar e emburrecer a pretexto de formar cidadãos que aceitassem educadamente a doença do mal do espelho) enchendo o quandro-negro de branquíssimas bobagens, as quais os alunos maquinalmente e disciplinadamente transferiam para o caderno para depois decorar para uma provinha dos nove da banalidade pseudo-científica e vero-emburrecedora.

Quem não se dispusesse a decorar e a copiar as branquíssimas bobagens ( os professores as chamavam de matéria, de conteúdo ) era imediatamente considerado um subversivo e por isso era manchado de vermelho, era desclassificado. Alguns alunos, talvez incentivados por algum professor que não soubesse escrever branquíssimas bobagens no quadro-negro ( e esse tipo de professor geralmente era carinhosamente chamado de artista), transformavam-se em leitores/escritores que faziam do enquadramento emburrecedor da escola a fonte inesgotável de aprendizagem e de libertação.

Era através da difícil arte de negar o enquadramento emburrecedor que alguns alunos conseguiam entender o mal do espelho, conseguiam aprender, a ler, a escrever, a serem colaboradores da vida, da terra.

Pelos idos de 2005, no jornal Sem Nome, essa história foi publicada.

Luis Eustáquio Soares

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