ESTATURA DA VIDA

Existem algumas frases que ficam marcadas em nossa mente por muito tempo, às vezes por toda a vida. Uma, especialmente, me acompanha há bastante tempo; trata-se do início da letra de um hino religioso, que diz: "Eu vivo à procura da minha estatura...". No início, creio que ela chamou minha atenção por fugir a convenções, mas, depois, cheguei à conclusão de que eu me identificava com ela, pois, de fato, ainda vivo à procura da minha estatura, e talvez o faça até o fim da vida...
Obviamente, não estou falando da estatura física, mas de outras muito mais significativas. Crescer fisicamente é, a priori, um processo natural embora existam "culturas" que enfaixam pés, para mantê-los pequenos, ou esticam pescoços, por razões estéticas; e tratamentos glandulares que aceleram ou contêm processos de crescimento. Essas são exceções... A estatura física elevada, aliás, é útil em várias situações, tais como: em cinemas, em shows ao ar livre (para fazer sombra para os outros), no vôlei, no basquete... Mas não é, necessariamente, sinal de inteligência, sabedoria ou elevação espiritual.
Essa estatura é muito mais difícil de atingir e medir, até porque não tem limitações físicas. Enquanto o crescimento do corpo ocupa espaço, tridimensional e limitado; o desenvolvimento da mente otimiza um espaço já disponível e, até prova em contrário, multidimensional e infinito.
O problema é como medir um e outro tipo de crescimento... No caso do físico existem sistemas de medidas mundialmente adotados, que medem sem discriminação: alto é alto e baixo é baixo, não importa credo, raça e condição social. No caso do intelectual, os educadores do mundo se desdobram na busca de fórmulas eficientes para ensinar e aferir o aprendizado, num dinâmico e constante processo evolutivo. Mesmo assim, ainda lutam para identificar a tênue fronteira entre a formação de pensadores autônomos e a tentação de doutrinar discípulos servis e dóceis.
Já os critérios de medição sócio-político-cultural ainda são bastante arcaicos, pois têm como referências intransponíveis os objetivos e predileções de quem faz a "medição".
"— Esse me serve! Esse não me serve!", parece ser o critério de avaliação padronizado, com ênfase especial nos quesitos: obediência cega, culto à personalidade e capacidade de renunciar à liberdade de pensamento. Os "pés", "polegadas", "braças" e afins ainda são estabelecidos pelos "reis" em cada um de seus "reinados". As únicas regras comuns que eles adotam são: o condicionamento dos que se submetem a esse tipo de avaliação à reverência pessoal, e sua condição de intocáveis e inatingíveis por esses "critérios". Será que isso é algum tipo de compensação, ou seja, treinam física e mentalmente as pessoas para que, "curvadas" fiquem menores do que elas? Obviamente, isso denota o medo que cada um tem de perder seu trono, afinal: "Rei morto, rei posto!".
Infelizmente, sua sobrevivência depende da manutenção da ignorância; daí sua influência no desenvolvimento intelectual se limita à interposição de barreiras ao crescimento dos outros.
Por isso é importante que nunca deixemos que os outros definam nossa estatura, e para tanto é indispensável que nossas vidas sejam estruturadas com elementos e princípios que nós dominemos e saibamos revisar e aprimorar, de forma a preencher progressivamente os infinitos espaços disponíveis em nossas mentes.
A relação entre o conhecimento e a mente é como coração de mãe: sempre cabe mais um! Mas não basta preencher espaços com conhecimento: é preciso fazer bom uso de ambos, senão seremos apenas arquivos de cópias - ou, pior, lixeiras - dos pensamentos dos outros.
Viver, como na letra da música, é uma consciente e constante busca da própria estatura. É uma benção divina sem limites e que sempre nos surpreende!

AS RODAS DA VIDA

Ta lá o corpo estendido, imóvel, na avenida!
Ao lado, uma bicicleta retorcida, um veículo estacionado de qualquer jeito, um motorista em estado de choque.
Alguém afirma que o ciclista cruzou a avenida no sinal vermelho...
Embora o termo acidente pressuponha imprevisibilidade, existem analogias que podem ser feitas, por exemplo, com a segurança do trabalho: ato inseguro é pessoal; condição insegura é ambiental.
No trânsito, a condição insegura é evitada com pavimento, sinalização e fiscalização adequados; já o ato inseguro é função do condutor, seja qual for o veículo utilizado. Assim, é infelizmente comum vermos motoristas que fazem conversões irregulares, estacionam em fila dupla só para não ter que manobrar, mudam de faixa abruptamente e sem sinalizar, falam ao celular, dirigem grudados; motociclistas "costureiros" ou que transitam em alta velocidade por entre congestionamentos; pedestres que atravessam fora da faixa de segurança; carroças em avenidas principais, em horários de pico... Mas, o que dizer dos ciclistas?
Com raríssimas exceções, ignoram propositalmente a sinalização viária, com risco pessoal e de terceiros.
Dentre seus atos inseguros podemos citar: transitar na contramão; não parar em cruzamentos, mesmo com sinal vermelho; "costurar", de preferência usando os pés e as mãos para passarem entre os carros; querer treinar ciclismo de competição em vias públicas; fazer fila dupla em avenidas só para "bater um papo" enquanto pedalam; "ilhar" pedestres na faixa, que têm que esperar a passagem de "pelotões" desembestados para concluírem a travessia; e tudo isso impunemente, pois as autoridades alegam falhas na legislação pertinente ou dificuldades operacionais para aplicarem aos ciclistas os mesmos rigores implacáveis destinados aos veículos automotores. Para piorar, somam-se aos atos inseguros a condição insegura das bicicletas, muitas sem retrovisores, freios ou sinalização.
Aos motoristas é recomendado respeito aos ciclistas e prática de "direção defensiva"; mas a recíproca não é verdadeira.
Logo será preciso apelar para a "direção premonitória", tal a imprevisibilidade e irresponsabilidade das manobras.
A implantação de ciclovias é uma parte da solução, mas temos que analisar objetivamente dois aspectos:
I - É absolutamente inviável implantar ciclovias em todas as vias da cidade;
II - O problema não é a postura do ciclista dentro da ciclovia, mas os atos inseguros e irresponsáveis que ele poderá continuar praticando fora dela!
Assim, se as campanhas educativas atuais não surtem efeito, que sejam reformuladas!
Está mais do que na hora de atuar mais incisivamente na inibição dos atos inseguros, senão continuaremos a ver corpos estendidos, famílias desamparadas e traumatismos físicos e psicológicos, com a cumplicidade da omissão de quem de direito.

Adilson Luiz Gonçalves

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