APRENDIZADO
Eram dezoito horas. Chovia desde o dia anterior. A água feita enxurrada, sem cabeça para raciocinar — como dizia o faxineiro —, descia à deriva, à mercê da gravidade, dos bueiros entupidos e dos cruzamentos. Em pouco tempo, as marginais foram desaparecendo, ficaram submersas.
"O que famos fazer hoje?" os campos alagados não deixavam opção: ficamos em casa. Era baixar o rio para sairmos à caça de preá. A várzea barrenta fazendo um ruído esquisito — ploft, ploft."Peguei..." Era dos grandes!...
Não deu para perceber, a infância passou apressada. Hoje, há água suja, esgoto, na várzea. Um grupo de crianças se oferece para retirar um carro, vítima da chuva, do local. "Um pau para cada um." Eram cinco. Havia outra opção? O homem, já desanimado, concordou. E foram ágeis. "Um, dois, três..." O carro respingando. "Um, dois, três...". Uma segunda e... "Ei, espere! E o nosso? Viado!" O homem sorriu, abanando uma nota de mil pela janela do carro.
"Moço, quer que tiremos o carro?" Olhei-os... "Mandem ver!" O menor sem deixar barato: "Passe aqui o cincão adiantado, doutor!" E havia jeito?
Carlos Alberto Pessoa Rosa
De: Blocos - jornal/revista cultural aternativa nº 31, 1998, RJ