Dia da Criança. Você acredita?

No Dia da Criança, eu queria acreditar em milagres, mas não consigo.

De verdade, eu acredito apenas em crianças. Se milagres existissem, crianças não precisariam deles para se livrar de doenças. Não seriam submetidas a maus tratos e ficariam imunes às imbecilidades dos adultos. Mas milhões de crianças sofrem porque algum adulto (ou algum santo) deixou de fazer o que precisava.

No fundo, eu ainda torço para que minha incredulidade seja vencida pelo divino. Mas só consigo acreditar nos olhos tristes das crianças abandonadas, esperando que alguém as resgate das instituições onde estão escondidas. Será que esse resgate depende de um milagre?

Continuo acreditando na vida, certo de que, para isso, não preciso de rezas, mas preciso da fé. Não a fé pasteurizada dos templos e das igrejas, mas a fé que vem de dentro da gente e é dada de presente ao mundo para melhorá-lo.

Acredito na firmeza das crianças que falam: eu te amo. Porque, mesmo quando desamadas, continuam amando. Mesmo quando violentadas não deixam de amar. Mesmo sem amor, amam. Amam apesar da violência, apesar do descaso e da arrogância dos adultos.

Não há como deixar de acreditar nos pequenos que protegem seus bonecos como se fossem gente, enquanto a Sociedade brinca covardemente com a infância miserável e faminta, como se lidasse com bonecos. E não falo do governante, do político, mas de gente assim como eu, que sofre, trabalha e perde a esperança, mas que não deveria perder o respeito.

Reafirmo minha crença no choro sentido do menino que machucou o joelho, da menina que cortou o dedo e dos coleguinhas da creche diante do bichinho de estimação que morreu de repente. Onde estão os milagres que não poupam esses delicados corações das crueldades? Onde foram parar todos os anjos diante do sadismo que mata?

Desculpem este lamento tão comum, mas não consigo imaginar festividades do Dia da Criança, que também é Dia de Aparecida, quando tantas crianças desaparecidas figuram como sombras nas paredes da insensatez.

Eu acredito nas crianças.

Maurício Cintrão

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