Velhice é não sonhar

            “Vida é fazer/todo sonho brilhar”. Idoso é quem se dá o direito de sonhar. Idoso (mesmo se jovem) é quem se conforma em ser infeliz.Há uma diferença muito grande entre ser velho e ser idoso. Pode ser considerada idosa uma pessoa que, tendo alcançado idade avançada, mantém-se ativo, alegra-se em traçar planos e projetos de vida, dando-se ao direito de sonhar, como o fazia em seus dias de juventude e maturidade. Já uma pessoa enquadra a si mesma na condição de velha quando transforma o ter alcançado avançada idade em obrigação de tornar-se rabugenta, sendo um poço de lamúrias e reclamações, dirigidas contra todas as pessoas com quem convive, alvos preferenciais de seu desgosto ou inapetência de viver.

             O ser humano se constrói segundo a intensidade ou a qualidade de seus sonhos. E começa a morrer quando perde a capacidade de sonhar, e de querer ser feliz. Uma pessoa que sonha, por mais idosa que seja, não é vista como velha, e nem assim se vê. Os sonhos que acalenta infundem juventude e força a seu corpo e mente. Ao ver o amanhã povoado de visões e imagens projetadas por sua alegria e bom ânimo de viver, para ela se prepara sempre alegre e bem humorado. Um energia poderosa e sutil infla as velas de sua alma ardente, inflamada de desejos, esperança e utopias. Não raciocina em termos de não dispor de muitos dias, para ver realizadas as metas que projeta.

            Gonzaguinha o sabia: “É triste ver esse homem/que castra seus sonhos/ Seu sonho é sua vida. Sua vida é seu trabalho/ e sem o seu trabalho/um homem não tem honra/”.O simples sonhar e idealizar constitui-se na fonte de energia de que se alimenta, para não se deixar derrubar pelo fato de não mais poder entregar-se a frenéticas atividades; não se angustiando e nem se desesperando pelo fato de terem ingressado no tempo da lentidão, nem por isto deixam de desejar coisas boas, para si e para as pessoas que amam. Conheço jovens de vinte anos que já são idosos, caminhando celeremente para se tornarem velhos pouco depois dos trinta. “Eles não sabem nem sonham/que o sonho comanda a vida/que sempre que o Homem sonha/o mundo pula e avança”. (Antônio Gedeão). Eles não sabem nem sonham que a vida é feita de sonhos. E que o sonho de voar é que deu asas às aves. Se o sonho é que faz o Homem criar, mesmo “a pedra pode nos ajudar a sonhar”. (Bachelard).


Violência contra os indefesos: a trágica normose

            Por todas as mídias vemos, com horror e espanto, denúncias de bárbaras violências e atrocidades cometidas contra crianças e pessoas idosas. E, o que é pior: cometidas por membros da família, pais, padrastos ou madrastas, que deveriam amar e proteger, como cuidadores da vida. Crianças torturadas, maltratadas ou mortas, com requintes de selvageria e insensibilidade, até mesmo pelos pais, como sucedeu com Isabela Nardoni, ou com Lucélia, vítima de uma “bem sucedida” empresária, normal, normalíssima, ou com Laila Fonseca, de 9 anos, encontrada morta no quintal da casa onde vivia. Como bem lembra o pungente texto da repórter de Cidades de O Popular: pessoas idosas também são humilhadas, machucadas no corpo e na alma, por pessoas que, muitas vezes, vivem de seus proventos.

            A velhice como um peso para as famílias – eis o traço da doença social e familiar – o envelhecer encarado como um fardo levanta a questão: não está profundamente doente a sociedade (bem como a família) para quem envelhecer é uma indecência, uma afronta ao conforto das outras pessoas? Seria um crime não ter morrido mais cedo? Não é coincidência o fato de se cometerem bárbaras atrocidades contra crianças e pessoas idosas: o alvo, nos dois casos, é a inocência, a incapacidade de auto-defesa. O que torna tais atos ainda mais hediondos. Buscar absolvição psiquiátrica para tais atos seria justificá-los, absolver os criminosos por atacado, como está. Assim, qualquer pessoa pode cometer qualquer barbaridade alegando que esqueceu de tomar seus remédios. A vingar tal estratégia, seria lícito liberar todos os detentos de todos os presídios, liberando-os de suas penas e dos muros que os isolam da sociedade que feriram.

 Brasigóis Felício

« Voltar