PIXURUCA

Saiu deslizando, passou pelo quarto. Nem sombra da criatura. Achou que podia voltar e deitar-se. A rede continuava atada. Ultimamente ele adquirira o péssimo costume de saltar sobre ela. Mas o carinho doía. Queria que aqueles olhos azuis não fossem tão expressivos. Ele era intenso e seus movimentos tão inesperados que ela imaginava como esquivar-se acertadamente de seus arroubos, saltos e assaltos.

Tentou sair sorrateiramente, indo em direção à porta da cozinha na ponta dos pés. Talvez pudesse abri-la silenciosamente, antes que a surpreendesse, tendo assim que continuar o jogo de esconde e pega. Ele todo enroscado parecia dormir.

A cada vez, era a mesma coisa. Ele vinha inesperadamente lançando-se sobre ela. A forma animal de sua posse. Esquivava-se. Ele, ofendido, sumia em qualquer lugar da casa, durante o tempo exato, de ela sentir remorso por desconsiderar o seu amor ruidoso. Então, saía procurando-o a chamar. Nhem! Cadê você? Não some.

Temia que qualquer dia ele saltasse pela janela só para causar-lhe remorso. Dessa altura toda! Polícia; bombeiros, sirene... Como explicar?

Ele logo descobriu o esquema dela, começando a comandá-la, que se arrependia de tê-lo trazido para casa, de ter-lhe aberto seu quarto e deixado que ficasse. Que criatura espaçosa! Não podia escapar-lhe, pois dia e noite atento acompanhava-lhe os movimentos. Deixara-se ficar.

E como viver agora sem vê-lo em sua casa, em sua vida. Tão companheiro. Assistindo TV a cabo juntos. Horas e horas juntos ao computador brincando de fazendinha no ORKUT. Esse gato. O companheiro que acompanha!

Nazilda Corrêa