Coluna de 28/6
(próxima coluna: 14/7)
O Teatro e suas origens
Todos sabemos que as origens do teatro no mundo estão envoltas em obscuridade e um incrível mistério, revelando sua proximidade com os ritos das religiões primitivas. Esta energia ou o saber representá-las e organizá-las num fluxo de ações e conceitos, faz, da interpretação, este ato que chamamos rito. E os ritos de passagem na vida, aqueles que realizamos de uma fase para a outra, sejam nascimento, morte, casamento ou alguma grande conquista, são observados e transcritos para que sua representação ali viva, nos faça perceber como espectadores, a tudo o que vivemos e/ou nos rodeia socialmente. O berço cultural do teatro ocidental (Western Theatre), com suas representações e construções para receberem o público em espaço aberto, ocorreu na Grécia Antiga. Essa influência ainda existe forte hoje, não só na evolução do drama em si, como também no uso de certas palavras, tais como drama, orquestra, cena, tragédia, comédia, teatro etc. Enfim, eles foram mesmo os patriarcas do palco ocidental e o desenrolar de suas vivências, filosofias e histórias tem até hoje muito para nos contar. Vejamos um pouco dos conceitos básicos, sob a perspectiva da divisão e análise, dos quatro principais períodos do teatro na história do Ocidente.
Antigüidade
Aqui ocorreu o surgimento do drama clássico, ou seja, o embrião do fazer teatral na Grécia (Ésquilo, Sófocles, Eurípides, Aristófanes) vivido em Atenas no século V a.C., associado ao culto de Dionísio, deus dos prazeres do vinho e do êxtase. Ali se davam as representações de tragédias, comédias e dramas realizadas por atores que traziam a personalidade de seus personagens expressas através do uso do vestuário e das máscaras dos ritos. Neste período, apenas os homens atuavam, inclusive fazendo todos os personagens femininos, fato pelo qual as máscaras ajudavam bastante. O drama passou a alcançar maior firmeza na ação e dinâmica no diálogo quando elevou o número de atores de 2 para 3 na cena e também ao reduzir os tais interlúdios obrigatórios do coro. O palco inicialmente consistia apenas de uma rotunda plana, também com a orquestra e um altar no meio, com um cenário e algum equipamento técnico. Depois vemos o surgir, a construção dos teatro chamados de semi-arenas, no formato de meia-lua. Os romanos depois vieram e se apossaram do teatro dos gregos e a partir dele, começaram a desenvolver a arte de representar e a arquitetura teatral em formas cada vez mais ricas. Com isso, os anfiteatros tornaram-se um ponto de encontro, magníficos centros de reunião para um público que ali iria assistir as tragédias e comédias tradicionais. Os teatros passaram a ter mais recursos como, por exemplo, cortinas e tetos improvisados e a partir de então, no mesmo período, as mulheres passaram a ser admitidas em cena.
Idade Média
Este foi um período meio dark na história da humanidade, longo e cheio de preconceitos, pragas, doenças incuráveis e com muito fanatismo cercando as comunidades. Por este mesmo motivo, ocorreu d urante alguns séculos uma luta violenta entre o teatro e a Igreja, travada entre as partes de forma repulsiva e agressiva, a qual terminou quando da queda do Império romano. Foi, no entanto, a Igreja que veio suscitar nova vida no teatro. Acontece que nas grandes festas religiosas a forma como se buscava explicar a mensagem da Bíblia para o grande público, era de maneira a ser apresentada em latim, na missa, ou seja, com muita encenação, um rito completamente preparado e ensaiado, pois poucos realmente falavam ou dominavam o idioma. Agora já não era mais o teatro profano de Dionísio, mas sim o sagrado da representação da vida cristã. Em torno do ano 900, surgiu então no campo religioso um novo teatro e um novo drama, que assumiu a forma de mistérios, de milagres e moralidades. Toda a arte se voltou para o tema do sagrado, com muitos nobres mentores patrocinando pinturas, arquitetura, musica e também o teatro. Com isso, atores dantes profissionais de feira e saltimbancos das ruas, desenvolveram sua mímese a partir do que se fazia na commedia dell'arte antes, criaram a oportunidade adaptando as pecas em novas situações e com as suas improvisações e personagens fixas, passaram então a tornar o teatro uma nova formula e mais uma vez um entretenimento acessível, popular e indispensável.
Idade Moderna
Com a chegada do Renascimento, inicia-se uma nova fase com tentativas no sentido de reviver as formas clássicas da arte.Primeiramente na Itália, surgiu o projeto arquitetônico jamais realizado, de um teatro totalmente fechado e coberto. Logo a seguir, os arquitetos italianos/romanos começaram a propor sua nova forma de arte pelo continente, inaugurando assim, em grande estilo, uma nova atividade de negócios por toda a Europa ocidental. Em toda a parte, bem convencidos, empreendedores construíram teatros de Corte, cujas possibilidades de se criar um mundo de ilusão, algo que entretivesse as pessoas, foram pouco a pouco aumentadas por meio de novos achados técnicos, ou de design ou forma. Mas um novo teatro deste tipo, algo não visto ou utilizado antes, em termos de privacidade para se assistir a uma performance, era em sua essência algo mais exclusivo. E foi assim que se criou um teatro para pessoas de alguma distinção social a mais. Nele, se representavam além dos dramas, também as famosas óperas neoclássicas, e suas produções começaram a ficar mais e mais luxuosas e sofisticadas pouco a pouco, no intuito de agradar o gosto dessa elite. Por outro lado, enquanto isso acontecia, também na Europa começou a ser criado um teatro para o povo, algo mais acessível, popular mesmo e sem a parte musical como epicentro. Foi então que na Espanha e na Inglaterra nasceram os grandes textos/dramas dos autores e mestres de reputação mundial na dramaturgia como Calderón (1600-1681) e Shakespeare (1564-1616). Algo mais ligado a comunicação de massa da época. Mas a partir do século XVII em Paris - que desde então se tornou o centro propulsor do teatro europeu - as coisas mudaram e se estabeleceram de uma nova forma para a cena teatral. Por entre teatros luxuosamente equipados e ricamente decorados, nos estilos Renascença e Barroco, o burguois passou a reinar e as montagens das peças de Molière e dos dramaturgos clássicos franceses, foram realizadas ao rigor da fantasia e da ilusão que a elaboração material pode pagar. Tudo muito bem representado, nos requintes de uma produção bem cuidada. Já o século seguinte, é um século que poderíamos dizer ser o “ dos grandes atores ”, quando a arte de representar se liberta das convenções do classicismo francês. A partir daí, uma encenação ocidental, passa a não ser mais, a mesma de sempre. Algo de novo está no front.
Teatro Contemporâneo
Essencialmente um repertório burguês, traduz o desenvolvimento do teatro no século XIX. Para estruturá-lo com sua produção de alto padrão e atingir o objetivo de massificá-la para atingir o break-even de bilheterias, busca-se um novo formato de auditório, também novos teatros particulares, com arquiteturas pensadas e desenhadas especialmente para isso. Assim, começaram a surgir nos grandes centros urbanos, os teatros profissionais. Além dessa parte de concreto e madeira, também vemos a importância crescente do encenador. Nada de bistrô ou café, a coisa agora é mais voltada para atingir um grande público, o maior possível e cabível dentro do teatro. Dentro dessa proposta, o Romantismo veio e deixou as suas marcas tanto nos textos das peças escritas como no próprio estilo da arte de representar. Temos como exemplos de grandes dramas realistas contemporâneos os autores europeus: F. Hebbel (1813-1863), H. Ibsen (1828-1906), G. Hauptmann (1862-1946) e A. Strindberg (1842-1912). A representação da vida em suas ligações e relações é a grande trincheira de trabalho desses autores, porém agora, dentro de um novo formato social, com novas questões urbanas e da própria era industrial que atingiu o mundo como um todo em seu desenvolvimento. Novas coisas surgindo e acontecendo, descobertas, novas formas de se fazer o já assimilado. A iluminação a gás e a luz elétrica, por exemplo, vieram para aperfeiçoar os efeitos realizados numa caixa preta, o palco giratório, as mesas de operação de luz e som, que começaram a ser pensados para isso. Estes avanços puseram novos meios revolucionários nas mãos dos criadores do teatro: Max Reinhardt (1873-1943) na Alemanha, André Antoine (1872-1966) em Londres e Constantino Stanislavski (1863-1938) em Moscovo. As grandes produções voltaram a acontecer, porem agora não somente para o requinte e o sofisticado gosto de um público exclusivo, mas sim com o objetivo de se realizar o grande show, aquele da grande performance de bilheteria esgotada e de lotação massiva, com efeitos e técnicas de luzes, som e fumaça para que o espectador fique inebriado e enfeitiçado com o que assiste, por conta da parafernália. Já em nosso século, seguindo também o ritmo de algumas produções “parafernálias”, temos outras tendências como o Naturalismo que também tem sido alternado com o Expressionismo e o Simbolismo. Acompanhando as tendências da arte contemporânea, tanto em dança, como artes visuais, música, moda ou cinema, o teatro também se entrega ao Minimalismo, a arte mínima para se comunicar algo essencial. E a partir daí, muitas novas formas de encenação já foram executadas com brilhantismo e êxito, buscando um teatro mais próximo de seu público e de seu discurso essencial, que esta na palavra e na fala do ator, a maneira como ele passa a emoção de seu personagem e as relações humanas ali entrelaçadas. Existe uma busca em se reduzir a distância entre o palco e o auditório, ao mesmo tempo em que o maquinismo teatral (toda a parafernália) foi aperfeiçoado e mesmo digitalizado, para que toda a operação de cada show, seja também minimal. Alguns diretores/encenadores se utilizam de linguagem multimídia, vídeos, projeções, interações dos atores com aparelhos ou equipamentos em cena ou ate mesmo a utilização deles, como a amplificação de vozes, para se contar cada vez melhor, a mesma história. Os dramas hiperpsicológicos das últimas décadas deram seu espaço às escolas realistas e a um tipo de teatro de alto efeito dramático, bastante conceitual e carregado de simbolismo. O gesto já não precisa vir decorado de purpurina para agradar ou entreter a platéia. O tema está ali em um portrait aberto, em sangue, suor e lágrimas para ser dividido com o público como mais uma percepção sensível e apurada da grande aventura humana, através da discussão levantada entre os personagens ali expostos.