Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em
fevereiro de 2002
Orestes e Iracema
(Parindo)
Iracema levantou-se suavemente da rede e, cheia de ternura, acariciou
orosto de Orestes que dormia feito anjo.
"Safado", pensou, "parece que comeu a melhor moqueca
de siri mole desse mundo".
Entrou em casa pois tinha muita coisa ainda por fazer antes que
a noite chegasse. Se não tivesse ficado vadiando e fazendo
amor a maior parte do dia não estaria tão atrasada
com a lida doméstica. Sorriu satisfeita.
Na rede, Orestes sonhava com Iracema, sua morena,... seu amor.
Ela surgira
em sua vida, mágica, sem muitos mistérios, quando
já havia se tornado mulher experiente dos assuntos do mundo.
Quando a tocava era sempre uma pétala orvalhada que se
abria, inundada de viço e desejo.
Orestes?
Caiu da rede, tamanho o susto causado pelos gritos da mulher.
Encontrou-a na
cozinha, segurando a enorme barriga, enquanto uma pequena poça
d'água formava-se sob os pés descalços e
pequenos. A bolsa havia estourado.
Calma neguinha, vamos para o hospital!
30 quilômetros homem! A criança está nascendo.
Me leva para o quarto.
Mas pombinha, quem vai fazer...
Nós dois, a natureza se encarrega de ajudar.
Um Orestes assustado carregou a mulher até o quarto, para,
saindo em seguida, providenciar o necessário para o parto.
Enquanto aquecia água e esterilizava a tesoura, matutava
em como fora louco de emprenhar uma mulher madura feito Iracema.
Estava apavorado. Chorou e as
lágrimas escorreram-lhe como chuva sobre o rosto, que,
também já mostrava os
primeiros sinais do outono. Agarrando com força o patuá
que trazia ao pescoço, rezou:
"Meu São Jorge, Pai da minha vida e condutor dos meus
caminhos, ouça cá seu
filho pecador e me responda se sem Iracema eu poderia ser feliz.
Perdoa Pai, sei que sou sem vergonha, que a vida inteira errei
a mão, mas meu amor é grande demais. Salve a minha
morena, e eu lhe juro que nunca mais vou botar os olhos nas coxas
da filha do Bento. Salve o meu filho pai, e eu lhe prometo que
se for moleque há de se chamar Jorge, e se for menina,
vai levar o nome de Lua."
Ai, Minha Nossa Senhora do Bom Parto, me dê uma boa hora.
Tá coroando, minha pombinha, tá coroando...
mais um pouquinho só de força.
Eu não agüento mais, Orestes... é dor demais...
Tá vindo... tá vindo...
O choro estridente da criança inundou a tarde quente e
foi de encontro à lua que já despontava no céu
vermelho.
É um molequinho, minha flor. Nosso Jorge. Quanto cabelo,
benza Deus.
Jorge?!?
É, ué...
Orestes, você fez promessa?
Ah! Ceminha...
Ficou vermelho, e nem era de vergonha, era de alegria. Sabia que
a parte difícil disso tudo seria deixar de pousar os olhos
nas coxas das moças. Mas o que não se faz por amor?
Mariza Lourenço
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