Textos veiculados na lista "Amigos de Blocos" em  março de 2002


"A increnca do Coroné"

Inté tô cum baita probrema. O Coroné qué qui eu diga pra todo mundo qui a dinheirama que discubriru com a filha dele, é tudo meu.

Qui era pra ele mi pagá das venda das abeia marimbondo qui vindi pra ele. Num sei não, tô achando qui vai dá increnca.

Vou telefoná pra meu filho qui é dotô lá na capitar e ele vai me orientá.

— Fio, expricá o que devo fazê, pra modo de me safá das increnca do Coroné.

— Ô Pai, deixa comigo que vou conversar com ele.

— Que bom fio, faça isso que sua mãe pode vortá a dormi.

Logo depois...

Entendo Doutor José, claro que sim, vou arrumar uma saída. Primeiro diga para sua filha pedir quinze dias de prazo que vou inventar uma estória bem convincente.

Estão todos com ela? Que bom, menos mal! É preciso guardar a honra da sua filha. Afinal dirige uma casa de respeito!

Inicialmente ela tem que se mostrar indignada e falar pra todo mundo que não aceita ser dominada por um bando de machistas e que não tem que dar explicações a ninguém.

Depois vamos comentar por todos os cantos da cidade que a casa é nossa e que
os homens que a freqüentam são todos respeitáveis e vão lá para discutir assuntos de interesse da comunidade.

Dê um jeito das moças se esconderem um pouco. Sabe como é né? Assim vamos
abafando as conversas.

Eu sei! Eu sei! O problema é o dinheiro. Eu estou pensando, pode ficar sossegado.

Como? Também pegaram os documentos da contabilidade da casa e do empréstimo
para a construção das novas suítes.

Puxa Doutor José, que mancada hem? Essas coisas a gente queima né!

Está bem, deixe-me pensar.

Doze dias depois...

Doutor José, já encontrei a solução: Diga pra sua filha anunciar domingo na missa das dez, que o dinheiro que o padre arrecadou dos fiéis para a construção da nova igrejinha e que deu para ela guardar foi surrupiado pelos ladrões da capital.

Como? Se vão engolir?

Não se preocupe. Todos os coronéis têm uma casa que nem a sua. O que difere
uma da outra é o câmbio na hora do pagamento. Depende se é com prazer ou não... entende.

Dito e feito...

— Ô pai, pode ficar sossegado, tá tudo resolvido. Foi fácil, assisti uma história igualzinha na televisão. É tudo igual. Tal qual na capital como no sertão.

Se ele também é coronel?

— Quase pai, quase...

— Beijos pai! E se afaste do coronel e seus amigos. Não é gente boa, não!

Douglas Mondo