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A LUZ NEGRA DO SOM DO ÓRGÃO DO UNIVERSO

            Sim, o som grave desses monstros do universo puderam ser ouvidos. No dia 9 de setembro se dizia: “Buracos negros cantam”. No centro da galáxia de “Perseus” (o nome já indica) há um enorme buraco negro, cuja massa talvez seja 2,5 bilhões de vezes maior que a do Sol. Os “Buracos negros” possuem tal densidade, tal força de atração, que sugam a luz ao seu redor, e por isso se chamam “negros” a esses “buracos”, a essas cavidades espetaculares. Eu fico imaginando o Universo como um gigantesco órgão, emitindo um som grave, profundo, “cerca de 57 oitavas abaixo da nota dó que fica no meio do teclado dos pianos, freqüência 57 bilhões de vezes mais profunda do que os limites da audição humana, um ruído muito aquém do que o ouvido humano pode captar”. “As imagens obtidas com os dados do observatório Chandra mostram duas cavidades enormes — em forma de bolhas — com cerca de 50 mil anos luz de largura, saindo do centro do buraco negro.”
            Um ano-luz equivale a 9,45 trilhões de quilômetros. Andrew Fabian, do Instituto de Astronomia de Cambridge, na Inglaterra, disse que as ondas são causadas pelo encolhimento e aquecimento ritmado do gás cósmico, provocado pela intensa força gravitacional que mantém as galáxias aglomeradas.
            O som grave que esses monstros do universo emitem podem ser comparados aos cânticos e mantras que no budismo tibetano são entoados, no limite extremo do som baixo da garganta humana, para os chamados dharmapalas, os protetores do dharma, como os mahakalas. Pasolini usou essas músicas soturnas no seu filme com Maria Callas, a “Medeia”.
            A lenda, que  faz das práticas desses protetores um som tão grave, diz o seguinte: certos monges rezavam a um mahakala durante muito tempo e nenhum sinal de sua presença ocorria. Então eles recorreram a um mestre que lhes disse para entoarem num tom bem grave, som de leão, de dragão, e assim ocorreu. Alguns monges cantam mahakala com o som da inspiração, e não com a expiração da voz.
            Havia cerca de 100 mahakalas no mundo antigo da Índia medieval de onde tudo veio. A lenda diz que os mahakalas (ou grandes negros, daí a lembrança), existiam antes de nossa era, de nosso kalpa, ou eon. Um kalpa é o tempo em que este universo aparece (ou explode) e desaparece.
            Há muitas eras atrás, havia um poderoso demônio que matava e comia os seres humanos de sua época e punhas suas cabeças num colar de cabeças decepadas com que se enfeitava. Os budas se compadeceram dos seres e se reuniram para ver o que podiam fazer. Resolveram destruir o demônio.
            Depois disso, viram que ele iria renascer ainda mais furioso por isso. Assim, resolveram pacificá-lo. Assim nasce a lenda de um dos mahakalas que protegem até hoje os praticantes nyngmas do budismo tibetano.
            É possível ouvir esses cânticos em CD e até pela Internet. São soturnos e belos, entoados por monges nos mosteiros. Os melhores são os do mosteiro Gyuto, do Dalai Lama.

 Sim, o som grave que esses monstros do universo emitem puderam ser ouvidos.