Ignorante fado enfuna
velas de um vago Bojador
a obsessão vulgar da fortuna
ordem do infante navegador.
Navegou louca ganância
de pés secos, nunca à bordo,
sonhos, mares de abundância
de dores, espectro sórdido.
De ponta sagrada pois erma
debruçou-se, acuado baco
enebriado de alma enferma
devaneio místico oceânico.
Era a compulsão da conquista
a lança primeiro fremia
num furor escravagista
tudo era assolado à histeria.
Luz de Ceuta doura e linda
faz a negra aura iluminada
Dom Henrique trama a senda
Ter Tânger dilapidada.
Parvo e tôsco mundo cristão
desafiou o mar tenebroso
flanco oculto, orgulho do Islão
tórrido elo bonançoso.
Aspirou povos sem maldades
engoliu culturas altivas
bafejou pelos arrabaldes
vomitou em plagas nativas.
O espírito desbravador
tão altaneiro e truculento,
inato engenhoso empreendedor
ceifa ondas contra frio vento.
décadas depois, Dom Manoel
afetado por sacro miasma
dos lucros,fez sair barinel,
em busca de rico fantasma.
nave barinel, vetusta
redondo, redonda vela,
barcha transmutada, astuta
daí a ciência fez caravela.
Por anos a fio arranhavam as costas
da senda tropical , Brasil
uma terra de peles tostas
D'homens largados à sorte vil.
Caboto então cabotava,
desovava degredados
que entre índios se abrigava
cada um destes desterrados.
Então a lenda criou corpo. adensado
o rei branco, prateadas serras
copo de ouro e de jóia ornado
com neve eterna em altas terras
Os charruas e carijós diziam
Já apontavam os tupiniquins
Terra adentro olhos se perdiam
Além dos picos, campos e afins.
O Rio Paraná era o caminho
Após salvo cruzar delta-mar
Rio da Prata num bergantinho
ao oeste o rumo certo tomar.
Mas,zelosos ainda os deuses
do povo inca tão pulcro e baio
fez esconder entre brumas e fozes
o caminho pelo rio Pilcomayo.
Doutro lado Aleixo Garcia,
numa apoteose inaugural
quase dois mil índios aliciaria,
criando nosso carnaval;
Deixaram a baía dos Patos
rumo firme ao rio Itapocu,
subiram seus vales e matos
e safos alcançarem o Peabiru.
Dali em trilha bem marcada
orientados para sudoeste
três espigões vindo em seguida
fizeram viagem inconteste.
Ponta Grossa e redondezas
para a direita as gargantas
do Guartelá e alterosas
Campos Gerais,terras santas.
belo de fato o rio Ivaí
transpôs-se-lhe pela nascente,
havendo ficado, o Tibagi,
Se fez o rio Piquiri ao poente.
Restando apenas o Iguaçu,
Passa-lhe perto da sua foz,
Num capricho do Peabiru
Sem ver a grande queda feroz.
Adentrando pelo vil Chaco
o rio Paraguai atravessando
a excursão seguia para Cuzco
fez-se aos postos de Sucre;
Lá,intrépidos, saquearam os incas,
aparvalhados pelo ataque,
ouro e prata trouxeram em pencas
do reinado de Huayna Capac.
Mas do séquito arrojado
Que aos portões de Cuzco chegou
apenas um gentio estropiado
à baía dos Patos alcançou.
Ao voltar pelo rio Paraguai,
os vulgos piratas das monções
chamados os da tribo Payaguá
dizimaram os incautos rufiões.
A lenda da serra de prata,
do rei branco milionário,
fez-se febre quase imediata
aos cavalheiros do templário.
Mas o mito logo se esfarelou
pois do inicial alvoroço
A chã vereda não mais se achou
ao Peabiru fez-se omisso.
Hernan Cortez à Vera Cruz finca
desvenda as serras de prata,
incendeia vil o império Inca
da gana vítima inata.
Ver Potósi posse espanhola,
sendo ingrata a rude senda
às estas terras não deu-se
bola,
por muito o Brasil foi lenda.
***
Hoje revendo a trilha do Peabiru
Remonto ser ela ainda ativada
Levando da Serra do Mar ao Iguaçu
Serpenteia linda, chucra, asfaltada
Sai de Piçarras, foz do Itapocu,
Sobe a serra do Mar a Ponta Grossa,
daí segue para oeste até Foz
do Iguaçu
Na qual ergueu-se "Vila muy Hermosa"
Para Cabeça de Vaca , espanhol louco,
restou o prêmio: achar a foz monumental,
do rio Iguazu, mas não evitou tampouco,
que fosse também de Portugal.
Já percorri todos estes caminhos,
insanos , mágicos, mesmo hoje,
as araucárias repletas de pinhos,
veloz cruzo os campos na laje.
Só assim consigo compreender o fato:
ridículo nos pareça até
então
bem risível sejam as desventuras
o porte da aventura destes homens sem porto.