Carta ao Escrivão

Mui Digníssimo Escrivão
Sr Pero Vaz de Caminha,
 

Espero que esta carta alcance Vossa Magnífica pessoa  onde, certamente, vós estareis dando continuidade ao ofício que o levou à celebridade por ocasião do descobrimento da Terra de Vera Cruz, Terra de Santa Cruz e finalmente Brasil.

Fique sabendo que são muitas as histórias e conquistas nestes 500 anos de nossa Era Cristã, desde que por aqui lançou âncora a nau do grande navegador português Pedro Álvares Cabral, abrigando sua nave na Baía de Porto Seguro e fincando para sempre as armas do Santo Império Português.

Como observou em sua carta ao El-Rei, esta terra não desmereceu suas observações quanto a sua fertilidade, embora, neste imensurável celeiro do mundo, grande parte da população morra de fome. Já os filhos desta pátria, na época uns pobres hereges de pele avermelhada pela tinta da árvore que deu nome a este paraíso, compõem atualmente a maior nação católica do mundo.

Lamento também informar que muitos foram as heranças  do ideário colonialista deixadas pelo império. Da árvore, o Pau Brasil, restauram poucos exemplares em sua Mata Atlântica que hoje possui apenas uns 5 por cento de sua forma original.  Apesar disso, a nação possui a maior biodiversidade e a maior reserva de água doce do planeta.

Dos ingênuos habitantes que circulavam nus entre vossos infantes, muito pouco restou. Para ser sincero, dos 30 mil índios daquela época sobraram apenas uns 3 mil que sobrevivem em áreas restritas.

Os que se atrevem a sair podem ser queimados em estranhos rituais feitos por abastados jovens da corte cuja capital foi transferida para o planalto central da nação.

Saiba Vossa Excelência que nos anos seguintes à vossa partida, a colônia foi mui valiosa em  seus frutos e por muito tempo forneceu  o reluzente ouro que cobriu o Império de Suas Majestades Lusitanas e Inglesas.

Foi nesse período que surgiu um importante movimento de independência da colônia liderado por um alferes dentista que recebeu a pena máxima por enforcamento e teve seu corpo retalhado e sua casa salgada, mas que hoje em dia é um dos mártires homenageados deste grande país. É conhecido pela alcunha de Tiradentes e o dia 21 de abril, data de sua morte, é feriado nacional.

Anos depois, quando Napoleão invadiu Portugal, a Corte Imperial emigrou para colônia que recebeu o status de irmã da Coroa Portuguesa. Dom João VI, um apreciador das artes e um devorador de galetos, assume o trono e mais tarde seu filho Dom Pedro I declara a independência, sendo o primeiro imperador desta grande nação.

Seguiu-se no trono Dom Pedro II, mas os ventos democráticos que vinham do norte conspiraram para um golpe de estado e a Proclamação de uma República que gerou 30 presidentes, quatro ditadores e um impeachment.

Seguiram-se anos de luta e a nação sobrevivia da monocultura, primeiro a do açúcar, depois a do café, e outras mais, todas utilizando mão de obra escrava que por imposição dos inglesas teve de ser abolida em 1888. A nova nação começava a industrializar-se e vieram os primeiros empréstimos através de um mulato e Ministro da Fazenda, doutor Rui Barbosa.

De lá para cá, todo suor do trabalho dos filhos desta nação é sorvido pelos juros dos banqueiros estrangeiros, mas mesmo assim, por ainda ter muita riqueza, ela é a oitava economia do mundo, embora ainda não conseguiu resolver os problemas das desigualdades sociais  entre seus filhos.

A maior herança deixada pelo império, talvez tenha sido a miscigenação racial tão bem  praticada nas futricações de Vossa Majestada, Carlota Joaquina e de seu filho Pedro I  e na tolerância em receber como irmãos os emigrantes que aqui chegaram com esperança.

Agora, eles constróem o dia a dia desta nação e podem ser visto em empresas vitoriosas. Recentemente uma  equipe de vôlei feminina - uma espécie de jogo com bola e uma rede de pescar no meio – foi campeã das Américas e no podium  lá estavam representantes das raças brancas, negras, amarelas, mulatas e cafuzas. A missigenação racial [e o grande segredo desta nação.

O esporte e a música são duas atividades que trouxeram muitas conquistas a este povo que com os recursos certos, também alcança vitórias na medicina, ciência e até na economia. É uma gente feliz e muito conhecida por seu Carnaval, pela prática do futebol e pelo celeiro de grandes craques da pelota.

Ah, no Carnaval todos os libidos são despertados sendo comum alguns homens se vestirem de mulher e saírem dançando ao sabor da maré. Portanto Vossa Excelência estaria confortavelmente adaptado ao folclore local não sofrendo qualquer tipo de represália, como ocorreu em Macau.

Fique Vossa Excelência sabendo que são muitos os descendentes  que se destacaram mundo afora pelos seus “que is”, embora às vezes necessitem de alguma apresentação, a exemplo de seu sobrinho tão bem recomendado a um cargo público por Vossa Excelência na carta ao rei.

Durante muito tempo tais cargos orgulhavam qualquer chefe de família o que não ocorre nos últimos seis anos. Tais servidores fazem parte da escória social e pelo novo modelo desenvolvimentista são os responsáveis pelo déficit do orçamento federal. Sorte de seu sobrinho por viver em outros tempos.

Mui Digníssimo Escrivão da Frota de Pedro Álvares Cabral. Continuamos, no entanto, a ter esperança, pois como Vossa Excelência previra há 500 anos: “que nesta terra em se plantando, tudo dá”.

Com todo o meu respeito e admiração,

Com todo o meu respeito e admiração,

Luiz Carlos Pires
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