Os 500 anos
Pelos quinhentos anos do Brasil, comemorados diversamente no território
descoberto pelos lusos, muito se escreveu e muito ainda se escreverá.
Não houve apenas gáudio, como desejado, pois a nação
não vive um de seus momentos mais felizes e tranqüilos, como
conveniente. Até pouca atenção se deu ao fato, em
abril publicado, de que os números das contas públicas em
fevereiro demonstravam que o superávit primário nacional
fora o maior desde 1991.
Outras preocupações residem na cabeça desse povo,
um tanto quanto desorientado em meio a um fantástico universo de
informações que incessantemente lhe chegam. Os portugueses,
entre os quais o presidente que aqui veio, demonstrou entusiasmo pela grande
nação que construíram na América, embora reclamando
maior intercâmbio comercial, sobretudo. Os brasileiros se dividiam
e tinham, e têm razões.
Jornal carioca de 21 de abril, data de acontecimentos significativos
na história, usou manchete: “Brasileiro não usa verde e amarelo
nos 500 anos", para manifestar sua frustração existente em
hora tão relevante. No texto abaixo, citava Pelé: “Tenho
vergonha do meu país", no que se fazia acompanhar de ilustres historiadores,
cientistas políticos e personalidades, que não se encantam
com os dias ora vividos.
Décio Freitas manifestou-se, ele historiador: “Somos um país
com mais de 50% da população excluída. Por isso não
vingou a tentativa de de se criar um clima de oba-oba nestas comemorações".
Gilberto Velho encontra o Estado envolvido por corrupção
e violência, enquanto o poeta Ferreira Gullar deplorou: “Não
posso ter orgulho de um país cheio de erros e injustiças
sociais".
Curiosamente, na mesma edição, o ministro Rafael Greca,
da Justiça, exultava-se, afirmando que “estamos escrevendo o prefácio
de uma nova nação". Sem embargo, em notícia reduzida,
ao lado, publicava-se que o procurador da República, Luiz Francisco
de Souza, anunciara um processo contra o próprio ministro, por dispensa
de licitação e gastos excessivos para a construção
da nau capitânia, usada nas festividades dos 500 anos.
Poder-se-ia usar a expressão vulgar: “É dose". E tamanha
que o homem da rua, o que mal se informa porque não tem dinheiro
para comprar jornal e conhecer com segurança as notícias
veiculadas, se sentirá num torvelinho. Dizer o quê? Sentir
o quê? Como julgar? O quê pensar? O que está acontecendo?
Para onde estamos indo?
Enquanto se tentava festejar o quinto centenário à altura
da grandiosidade da data, as televisões expunham cruamente manifestações
de desagrado em várias regiões. O presidente da República,
aguardando o ápice das festividades, programadas, procurava dar
demonstrações de tranqüilidade, que não coadunavam
com seu estado de espírito e as rigorosas medidas de manutenção
da ordem.
Mais recentemente, Fernando Henrique começou a revelar-se inquieto
com as atividades desenvolvidas pelo movimento dito dos sem-terras, em
diversas áreas do território, concomitantemente, obedecendo
a rigoroso programa para invasões. Desde o princípio se notara
essa disposição, vamos dizer para a mazela ou bélica.
O pior cego é o que não quer ver.
Claro que todos desejamos diminuir e eliminar as injustiças
sociais, atender aos justos reclamos da sociedade em todos seus segmentos.
Fundamental, porém, é definir como, quando e com quem.