A vida de otário que eu pedi a Deus

Pronto! Conseguimos! Desbancamos o Piauí, que era tido como o Estado mais pobre do país. O norte-rio-grandense é o campeão de pobreza e o brasileiro  que ganha o pior salário: média de R$ 416,44. A notícia foi veiculada, em  lugar de destaque, a coluna Roda Viva, do jornalista Cassiano Arruda Câmara,  de 24 de julho. Está lá com todas as letras: "Este é o resultado de um  levantamento feito pela Secretaria Executiva do Ministério da Previdência,  divulgado semana passada, que comparou os salários dos trabalhadores com  Carteira assinada. Aqui, o trabalhador ganha menos da metade do seu colega  do Distrito Federal, o melhor remunerado do País: R$ 972,38. O levantamento  coloca o Rio Grande do Norte como o Estado mais pobre do  Brasil:. Pobre e perdulário. Este vergonhoso título ocorre três anos  depois do Estado ter vendido seu maior patrimônio, a Coser, por mais de USA 600 milhões. Montanha de dinheiro que não chegou à base da pirâmide  salarial"; Pois bem, e não se pense nem se cogite que há saída. Ou que possamos ter um  fio de esperança qualquer de sair desse sufoco. Nada. É aquela coisa: o  assistencialismo venceu. E torna-se simplesmente vergonhoso, porque não dispomos de uma agência ou fonte de poder para recorrer. Nem podemos contar sequer com as forças de oposição e de resistência, porque, doravante, na música como no bicho, vale o que está escrito: está tudo dominado.

O total domínio mantido pelo governador Garibaldi Alves Filho sobre os poderes que deveriam ser controladores e fiscalizadores de suas ações no Executivo deverá resguardá-lo, e à sua família, de medidas punitivas por conta do escândalo trazido à baila pelo preso Luís Henrique Gusson Coelho, que envolve, a partir do cunhado do governador, empresário Marcos Santos, a administração estadual num esquema de superfaturamento de obras públicas, através de licitações fraudulentas, abertura de empresas fantasmas, o assassinato do empresário Pedro Alexandre e a fuga de 14 detentos da Penitenciária de Alcaçuz. A cena política trazida a público ganha relevo cinematográfico, como os roteiros produzidos a partir dos livros sobre a Máfia de Mario Puzo, exibindo um quadro onde agem empresários, traficantes, políticos e assassinos.

O esquema de poder da oligarquia Alves ganha sobrevida, da forma como se sobressai de uma pesquisa feita pelo cientista social Melquisedec Moreira da Silva, que resultou na monografia "As Bases do Conservadorismo Político no RN" para obtenção de grau acadêmico na UFRN, e que irá transformar-se em livro. O trabalho aprofunda, com base em instrumental científico, o estudo sobre o conservadorismo que caracteriza a vida pública no RN, a partir de famílias-grupos de interesse-oligarquias que dominam o espectro político no Estado. Informa Melquisedec que dificilmente esse modelo de poder permitirá que seja afetada a performance do governador, devendo, ao contrário, reverter em benefícios e vantagens para a campanha eleitoral do seu grupo político: a oligarquia Alves -, que pretende prosseguir sua saga no Rio Grande do Norte, com a eleição do filho do chefe do clã, o ex-ministro Aluízio Alves, o primo de Garibaldi Alves, o deputado federal licenciado Henrique Eduardo Alves. O trabalho de Melquisedec vem confirmar aquilo que os que estudam o poder no Rio Grande do Norte - e nos outros estados da federação - já tinham detectado: estamos no mato sem cachorro, pois até o cão de guarda da sociedade, a Imprensa, que deveria funcionar como o Quarto Poder, também vê-se neutralizada, há muito tempo, quando embolsou - em troca do vil metal - os pressupostos da sua funcionalidade e missão. Sendo que, no RN, diferentemente de estados onde outras forças políticas ainda se contrapõem - como o Rio Grande do Sul, por exemplo -, fazendo com que o Executivo encontre dificuldades para desvirtuar e dominar por inteiro a função dos órgãos que compõem a estrutura do regime democrático: o Poder Legislativo, o Judiciário (com o Tribunal de Contas e o Ministério Público atuando com independência), e a própria imprensa, que se transforma no espelho para garantir uma providencial transparência das ações dos homens públicos.

Para os estudiosos do tema, o Ministério Público e o TCE têm se tornado um desdobramento natural da carreira política nesse aspecto, no jogo de controlador e controlado, por seus membros passarem de um lado para o outro, passando a julgar as contas do governo de cuja estrutura viciada acaba de sair, tornando-se conselheiro como uma espécie de prêmio.

No caso da Segov, secretaria superespecial criada exclusivamente para alavancar a candidatura de Henrique Eduardo Alves, diz o cientista social que ela repete exemplos de outros estados, como São Paulo, na época de Quércia e de Fleury, com a finalidade de garantir o controle da base política no interior. Uma poderosa estrutura é montada, com o dinheiro do contribuinte para fornecer informações sobre a situação política das diversas regiões políticas ao secretário, utilizando-se de funcionários contratados e da própria máquina administrativa. Tem também uma função de natureza policial, procedendo a investigações da vida dos adversários e dos aliados.

Quanto à boçalidade verificada no comportamento de profissionais da imprensa, ganha algum contorno na descrição feita na carta do leitor Carlos Ribeiro, publicada na coluna "Mídia"; (Caderno Muito), do Diário de Natal de 14 de julho de 2001 (aniversário da Queda da Bastilha, na França): "Esqueçamos do Boechat, afinal de contas ele tem uma carreira brilhante da (na) grande imprensa e obviamente deve ter ganho muita grana durante esses 30 anos de jornalismo. Que mal-estar é esse que você fala na coluna? Tá brincando, é? Acontece isso aqui em Natal a torto e a direito muita gente aqui é injustiçada porque meia dúzia de puxa-sacos monopoliza o esquema. Infelizmente o jornalismo do RN é de péssima qualidade, feito para enaltecer os políticos donatários dessa terra minúscula. Cadê a seca? Cadê a miséria em que vive a maioria da população do nosso Estado? Vamos parar de brincar de Miami e fazer jornalismo de verdade. Mas esqueçamos tudo isso, pois a panelinha acha tudo lindo, porque ganha passagem de avião, vai para a costa do Sauípe, corre atrás dessas peruas caipiras atrás de mimos tolos e vai levando a vida. A grande maioria (99,9%) esquece das origens e acha que já é o máximo. Depois querem que o povo lá do Sul dê valor ao RN, tás brincando!!!"; É este o seu Estado. E esta é a sua vida! Um charco, com seus sapinhos e sapões.

Paulo Augusto