As Minas e as Gerais
Andei por alguns lugares de Minas. Torresminho, couve, cachaça
amarela da boa; gente corada, simpática, bonita. Natureza pródiga:
montanha, campo, verde, céu azul. Fonte de água límpida:
boa pro corpo — por dentro e por fora.
Cozinha próxima à sala, no fogão à lenha
água fervente pro café fresquinho da tarde — no bule de ágata.
As panelas de ferro secam ao sol, a roupa é quarada na grama verdinha-verdinha,
como eles dizem. Bolo de fubá ou biscoitinho de araruta acompanham
a visita, e o queijo fresco, que não pode faltar. Na bandeja,
a toalhinha bordada pela avó para o enxoval da dona da casa. Orgulho
do pai, chega o filho a cavalo — montado a pêlo, sem cela — apenas
uma corda atada à boca do animal que ele mesmo domesticou. A dona
conversa tricotando a renda extra da família, pois a filha mais
velha quer ser professora e estudar na cidade grande.
Casa cheirosa, chão de vermelhão brilhante. Azulejos?
Só até a metade — o resto é tinta a óleo mesmo.
As portas azuis quase coloniais — na idade e na cor. Capricho e limpeza,
simpatia e amabilidade.
Pão de queijo? É folclore "modernoso", "trem" novo inventado
na capital. Bom mesmo é doce de leite feito "inda agora de pouco".
Aroma na varanda, que é repleta de vasos com gerânios e flores
outras. Quatro cadeiras de vime, adornadas com almofadas que a dona mesma,
em pessoa, costurou e bordou. Um nome em cada uma delas — em cada nome
se revela o dono da cadeira. Fico com vergonha, por estar invadindo espaço
tão nobre, onde deve se assentar apenas o proprietário.
A dona me deixa à vontade: "faço questão da moça
se assentar na minha cadeira!". E me sinto pessoa importante, assumo ares
de paulista da capital — cidade grande, os óculos me conferem expressão
de inteligência e conhecimento — mas, nem viajada sou! Gosto mesmo
é desse interior gostoso, cheiroso, prodigioso, brasileiro, que
só a dona sabe entender.
Sinto inveja e saudades. Saudades da varanda de minha avó, das
telhas à vista, das estrelas no céu, dos gerânios na
janela, da tinta descascada, do avental cheirando a gente real, como essa
dona que me atende e é muito mais do que eu.
Thaty Marcondes