GLAUCOMATOPÉIA [#33]

[1] A fama de poeta escatológico me acompanha desde o início, e, embora não corresponda proporcionalmente às temáticas universais que tenho praticado, justifica-se na medida em que ainda uso a simbologia da merda para expressar diversas formas de indignação, não apenas contra a mediocridade criativa na própria poesia, como a princípio mais objetivei. Exemplo recente da retomada coprológico-metafórica foi este soneto:

SONETO 613 EVACUADO

Cocô, matéria fétida e salobra,
formato entre o cilíndrico e o esférico,
que às vezes liquefaz-se, disentérico,
ou fere o anal canal pelo qual obra.

Se cai em terra firme, ele se dobra
e n'água ele flutua como ibérico
veleiro; num esgoto periférico
encalha, sem espaço de manobra.

Marrom, tonalidade do tolete.
Destaca-se, mais claro, o amendoim
que os gomos lhe craveja e não derrete.

Não nego, o troço causa nojo em mim,
mas vem donde, na marra, fiz cunete...
Ainda o comerei se achar ruim!

[2] Mais especificamente sobre a perda da capacidade sexual, os glosadores enfrentam motes do tipo deste, assim resolvido pelo poeta potiguar Luiz Xavier:
NÃO TEM JEITO QUE DÊ JEITO,
EU MESMO NÃO FODO MAIS!

A bicha está com defeito,
Sem ter mais apelação!
Só vive olhando pro chão,
Não tem jeito que dê jeito!
Daí me nasce um despeito,
De não ser mais eficaz;
Passando mesmo pra trás,
Pedindo a Deus pra morrer!
Porque se o bom é foder,
Eu mesmo não fodo mais!

[3] De minha parte, não perdi oportunidade de juntar a fome com a vontade de comer, ou seja, a cegueira com a vontade de sofrer, e selei a fórmula autocomplacente nestes termos:
Vim ao mundo com defeito,
Fadado a ser masoquista,
Pois para o meu mal da vista
Não tem jeito que dê jeito!
Quem vê, falava: "Bem feito!"
E, a rir, calava os meus ais
Com penetrações orais...
Hoje ainda sou passivo,
Mas só mental, já que, ao vivo,
Eu mesmo não fodo mais! [8.59]
GLAUCO MATTOSO
Poeta, letrista, ficcionista e humorista. Seus poemas, livros e canções podem ser visitados nos sítios oficiais:
http://sites.uol.com.br/glaucomattoso
http://sites.uol.com.br/formattoso