CHICO LOPES
     
 

ENTREVISTA DE CHICO LOPES
a Henrique Chagas, para o site Verdes Trigos

Próximo livro de Chico Lopes será de poesia

Depois de publicar três livros de contos (Nó de Sombras, Dobras da Noite e Hóspedes do Vento) e o romance O estranho no corredor (pelo qual recebeu um Jabuti 2012 na categoria), Chico Lopes surpreenderá os leitores, acostumados com sua prosa, com seu próximo livro, CADERNO PROVINCIANO, que será de poesia, devendo ser lançado brevemente. Em entrevista ao VT, ele fala com Henrique Chagas sobre esta publicação:

VT - O salto da prosa para a poesia não parece estranho? Em geral, a gente observa o contrário na vida literária, porque todo prosador no Brasil parece ter praticado poesia no início e desdenhado depois.

Chico Lopes – É verdade. Não parece comum. Mas eu comecei, nos anos 60 e 70, quando adolescente, escrevendo letras de música (na época, todo mundo queria ser Caetano, Chico ou Gil) e algumas letras que fiz para músicos até ganharam festivais modestos, do interior. Eu queria ser poeta de música popular, muito influenciado pelas letras do tropicalismo e dos Beatles, ou mesmo de Chico Buarque. Só um dia, ao entrar numa velha biblioteca, me deparei com um livro chamado “ Terceira feira ”, de João Cabral de Melo Neto, e me deslumbrei com aquilo. Mudei de ideia. Desandei a fazer poesia imitando o João, e depois fui descobrindo mais gente, Pessoa, Drummond, Cecília, Rilke (foto) , Quintana. Escrevia e rasgava muito. Nos anos 80, no entanto, tomei a decisão de criar uma espécie de cadernos de poemas quase confessionais, que fui reelaborando e guardando. Escrevi-o e reescrevi-o muito. Ainda em 2003, estava reescrevendo-o. A conselho de um amigo, que gostou muito daqueles poemas, guardei-o. Ficou inédito por pra lá de duas décadas. E pensei que deveria publicá-lo algum dia. Parece que a hora chegou.
Posso garantir que a minha prosa, e a origem de muitos personagens que depois se espalharam em meus contos, está nesse livro. Portanto, ele tinha uma importância grande para mim. Espero que a tenha para os leitores.

VT – Qual é o motivo desse título?

Chico Lopes: – Quis que fosse um título despretensioso, e um tanto irônico. Porque os poemas versam muito sobre a solidão de um narrador oprimido pela vida no interior que mescla seu lirismo inato a constatações sombrias. O “ provinciano ” aí é paródico, porque minha ambição foi universalizar minha experiência de isolamento – quis me proteger de críticas à minha pretensão assumindo o adjetivo (rs). A influência de Drummond, de Rilke , de Baudelaire, Rimbaud, é visível. Foram os poetas que mais me impressionaram. São poemas ora bastante longos ora muito breves. Penso que o livro tem uma unidade interessante. Talvez tenha sido por isso, por senti-lo pessoal e coeso, que o mantive. Um amigo, Claudemir Belintane, docente e pesquisador da Faculdade de Educação da USP, a quem o dedico, ajudou-me muito na decisão da publicação. O conhecimento do editor Eduardo Lacerda e equipe, que lutam obstinadamente pela publicação de poesia na Patuá , lançando livro após livro de alta qualidade, me deixou feliz. Creio que encontrei a família editorial certa, digamos. Livros de lindas capas e belo conteúdo.

VT – No panorama atual da poesia brasileira, o que mais o interessa?

Chico Lopes – Sem querer ofender nenhum amigo prosador, por vezes encontro livros de poetas que me parecem estar mexendo mais profundamente com a literatura brasileira do que os dos prosadores. Tenho lido gente muito boa como o Iacyr Anderson Freitas, o Fernando Fiorese, o Flávio Viegas Amoreira, Antonio Secchin, Marco Luchesi, Carlos F. Moisés, Leila Míccolis, e percebo que há muita gente que merecia plenamente ser mais conhecida. Há todo um peso de “ maldição editorial ” sobre o gênero, fica a conversa de que isso não se vende e, súbito, todo mundo se surpreende com o livro de Paulo Leminski vendendo muito. Deve haver aí um equívoco que ainda não detectamos direito. Gosto da liberdade de caminhos, cada um construindo seu perfil total, sua obra. Estou deixando de citar muita gente. Há muitos livros de poesia saindo e há muitas descobertas a fazer.

VT - Mas isso não significa que você está deixando a prosa pela poesia, não?

Chico Lopes – Não, não gosto de ficar em apenas um gênero. Parti da poesia para o conto, do conto para o romance, passei pelas memórias, e só agora publico poesia, mas não publico como um novato. Apenas foi um livro que deixei ir ficando inédito e que fui reescrevendo, acrescentando poemas (ele tem uma parte paulista e uma parte mineira, digamos assim, tendo eu vivido em Novo Horizonte e Poços de Caldas nesses anos), polindo, amadurecendo. Creio, aliás, que a lição de não publicar nada precipitadamente fica valendo; ademais, as próprias dificuldades de publicação acabam fazendo com que fiquemos muito tempo com nossos livros e possamos repensá-los, reescrevê-los por vezes indefinidamente. Isso só os beneficia, a meu ver. A carreira real de um escritor não é, a rigor, a mesma que cronológica e exteriormente é classificada a partir dos livros publicados. Sua carreira é de uma liberdade imprevisível. Aliás, graças aos deuses…

Fonte: http://www.verdestrigos.org/wordpress/?p=4464