GLAUCOMATOPÉIA [#50]
Mesmo quando mantenho fidelidade ao modelo clássico do soneto, não me furto a testar-lhe os parâmetros e exercitá-lo metalingüisticamente, inclusive parafraseando meus predecessores ilustres, como Gregório, que, por sua vez, parafraseou Lope de Vega. Seguem-se os "metassonetos" respectivos:
EL SONETO [Lope de Vega]Un soneto me manda hacer Violante,
que en mi vida me he visto en tal aprieto:
catorce versos dicen que es soneto,
burla burlando, van los tres delante.Yo pensé que no hallara consonante,
y estoy en la mitad de otro cuarteto;
mas, si me veo en el primer terceto,
no hay cosa en los cuartetos que me espante.Por el primer terceto voy entrando,
y aun parece que entré con pie derecho,
pues fin con este verso le voy dando.Ya estoy en el segundo, y aun sospecho
que estoy los trece versos acabando:
contad si son catorce, y está hecho.
O SONETO [Gregório de Matos]
Um soneto começo em vosso gabo:
contemos esta regra por primeira,
já lá vão duas e esta é a terceira,
já este quartetinho está no cabo.Na quinta torce agora a porca o rabo;
a sexta vai também desta maneira:
na sétima entro já com grã canseira,
e saio dos quartetos muito brabo.Agora nos tercetos que direi?
Direi que vós, Senhor, a mim me honrais
gabando-vos a vós, e eu fico um rei.Nesta vida um soneto já ditei;
se desta agora escapo, nunca mais;
louvado seja Deus, que o acabei.
SONETO 233 SONETADO [Glauco Mattoso]
Já li Lope de Vega e li Gregório,
pois ambos sonetaram do soneto,
seara na qual minha foice meto,
tentando fazer algo meritório.Não quero usar o mesmo palavrório,
mas pilho-me, no meio do quarteto,
montando a anatomia do esqueleto.
No oitavo verso, o alívio é provisório.Contagem regressiva: faltam cinco.
Mais quatro, e fico livre do problema.
Agora faltam três... Deus, dai-me afinco!Com dois acabo a porra do poema.
Caralho! Só mais um! Até já brinco!
Gozei! Matei a pau! Que puta tema!